31 DE MARÇO DE 2014
50 ANOS DE 1964 DESPERTAM
LOBOS EM ‘DEMOCRATAS’
Cinquentenário do
golpe militar de 1º de abril extrai verdades existentes dentro de personagens
emblemáticos; colunista Arnaldo Jabor, da Rede Globo, afirmou que País
"mereceu" quebra da democracia; ex-presidente Fernando Henrique
comparou presidente Dilma Rousseff a Jango Goulart, dando pitaco pela
desestabilização do governo; ex-governador Paulo Egydio relatou a Geneton
Moraes Neto caso de tortura e chantagem sobre o qual lavou as mãos em nome com
combate "ao comunismo"; ex-deputado Célio Borja negou ter havido uma
ditadura, mas apenas "um governo com plenos poderes"; jornais Folha
de S. Paulo e Estado de S. Paulo evitaram qualquer autocrítica sobre apoio
editorial – e logístico, no caso da Folha – dado ao golpe; blogueiro Reinaldo
Azevedo escreveu, como era esperado, que a culpa foi da esquerda; faltou propor
beatificação de militares
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– O aniversário de 50
anos do golpe militar de 1º de abril de 1964 mostrou os lobos que existem
dentro de personagens que se classificam como democratas.
Um dos primeiros a surpreender
em sua compreensão pelo movimento que quebrou o ciclo democrático por 21 anos,
cassou 174 parlamentares, extinguiu partidos políticos, perseguiu, torturou e
matou militantes de organizações democrática e de esquerda foi o colunista
Arnaldo Jabor, da Rede Globo. Polemista com verniz de liberal, ele escreveu que
"merecemos" o estado de exceção que as Forças Armadas impuseram ao
País. Para ele, as organizações populares não tinham compromisso com a
democracia, mas apenas em tomar o poder.
Seguiu também pela
linha de culpar o público pelo golpe o blogueiro Reinaldo Azevedo, que tirou de
seu saco de maldades o argumento clássico dos golpistas. Ventríloquo da
direita, Azevedo cravou que muitos dos apoiadores do presidente João Goulart
queriam "implantar uma ditadura comunista no Brasil". As eleições
presidenciais marcadas para 1965, como o então pré-candidato Juscelino
Kubistchek como favorito, ele, é claro, nem fez questão de mencionar.
Membro da Universidade
de São Paulo em 1964, tendo sido cassado do cargo de professor anos depois, o
ex-presidente Fernando Henrique deu uma derrapada ao falar sobre o tema. Com o
intuito de desgastar a presidente Dilma Rousseff, ela a comparou a Jango,
primeira vítima do golpe militar. Pelo mau gosto do paralelo, o que ficou foi
um pitaco de FHC na direção da desestabilização do governo. Após Jango, afinal,
veio o caos – e foi essa suspeita que ex-presidente deixou no ar.
Visto como um quase
democrata, o ex-governador de São Paulo Paulo Egydio Martins revelou ao
jornalista Geneton Moraes Neto, da Globo News, que sabia bem mais sobre os
porões do regime do que se permitira declarar até aqui. Ligado ao então
presidente Ernesto Geisel, Paulo Egydio afirmou que fora informado pelo então
secretário de Segurança Erasmo Dias de casos de torturas em presos políticos e
chantagens sobre comandantes militares, mas preferiu não interferir. "Eu
delegava poder para isso", esquivou-se.
O jurista Célio Borja,
que chegou a ser juíz do Supremo Tribunal Federal, fez a alegria do jornal
Folha de S. Paulo em entrevista na semana passada. Ele sustentou a tese de que,
simplesmente, não houve uma ditadura militar no Brasil, mas apenas
"governos de plenos direitos". Para uma publicação que professa o
termo "ditabranda" para classificar o regime militar, nada mais
adequado
Os 50 anos do golpe
não serviram para que, além da Folha, também o jornal O Estado de S. Paulo
fizesse qualquer autocrítica sobre sua participação no apoio à quebra da
democracia. Ambos os jornais participaram ativamente a campanha pela
desestabilização de Jango na Presidência da República, saudaram a tomada do
poder pelos militares e, em seguida, procuraram dar a maior legitimidade
possível à nova situação. A Folha, como se sabe, chegou a emprestar carros de
distribuição de jornais para o transporte de presos políticos para sessões de
tortura. Mas não foi desta vez que os jornais procuraram se redimir de seu
casamento com a tirania.