Para acesso ao programa, famílias
precisam comprovar
cinco anos de moradia na cidade
Maíra Gomes
Belo Horizonte (MG)
Na última
reunião do Conselho Municipal de Habitação, realizada dia 8 na sede da
Companhia Urbanizadora e de Habitação de Belo Horizonte (Urbel), foi aprovada a
obrigatoriedade de comprovação de moradia na capital por cinco anos para que
uma família tenha acesso a políticas habitacionais, como o Minha Casa Minha
Vida.
Antes da
votação, eram necessários apenas dois anos. “Já era difícil comprovar dois
anos, com cinco anos vai ficar ainda mais difícil. Sabendo disso, as famílias
vão se sentir ainda mais injustiçadas e podem acabar desistindo”, afirma
Luciene Pereira de Souza Gudes, conselheira suplente pelo Movimento de Moradia
de BH.
Toda a
população sem casa acaba atingida pela mudança, mas principalmente aqueles que
tiveram que sair da cidade por dificuldades financeiras, após anos de moradia
em BH, os que acabam de chegar em busca de uma vida melhor na capital ou os que
moram em ocupações irregulares, que têm imensa dificuldade em conseguir
comprovação de residência.
“Essa
aprovação é um golpe nas pessoas que têm mais necessidade de moradia, pois nem
sempre está morando na cidade ou não tem como comprovar endereço. Quem mora em
periferia, de favor ou aluguel não tem comprovante de endereço em seu nome. Não
adianta procurar a unidade de saúde porque muitas vezes não consegue”, conta
Ednéia Aparecida de Souza, militante do Movimento de Moradia de BH. Ela conta
que pessoas que já foram sorteadas para acesso às unidades do Minha Casa Minha
Vida na cidade aguardam a entrega das casas em outras cidades da Região
Metropolitana, que têm valores de aluguel mais acessíveis.
Para o
conselheiro Bruno Vieira, militante do Movimento Nacional de Luta pela Moradia,
já existem critérios suficientes para fazer uma seleção justa, como a
obrigatoriedade de participação em um núcleo de moradia por pelo menos três
anos, estar em moradia de risco, ter algum deficiente na família e outros. “A
esperança com o Minha Casa Minha Vida era de que a prefeitura pudesse atender
mais rapidamente às famílias. A obrigatoriedade de cinco anos serve apenas para
dificultar”, lamenta.
O advogado
e integrante das Brigadas Populares Joviano Mayer aponta que a aprovação de
obrigatoriedade de cinco anos de moradia na cidade foi um ato inconstitucional
por parte do Conselho. “Qualquer ato administrativo que tenda a excluir uma
parcela da população, a reduzir a abrangência de uma política pública, é
inconstitucional”, declara. Joviano denuncia que o impedimento de pessoas que
vivem há menos de cinco anos em BH cria uma política de ainda mais segregação.
Falta muita moradia em BH
Segundo
integrantes dos movimentos e moradia de BH e região, o tempo médio de espera na
lista para o Minha Casa, Minha Vida é de cinco anos, mas há quem já tenha dez
anos de inscrição sem ter sido contemplado. Desde o lançamento do programa em
BH, em 2009, foram realizados apenas dois sorteios, no fim de 2012 e início
deste ano, em janeiro.
“Nesses
cinco anos não foram entregues nem cinco mil unidades habitacionais, isso é
muito pouco. A prefeitura demora a viabilizar o terreno, dá uma contrapartida
muito baixa. Para melhorar o cenário, os governos estadual e municipal deveriam
entrar com contrapartidas”, destaca o conselheiro Bruno. Ele conta que desde a
década de 90, o governo estadual não faz nenhum investimento em moradia para
Belo Horizonte.
A questão
é que Belo Horizonte precisa de muito mais que isso para resolver a falta de
moradia para seus cidadãos. Segundo estudo realizado pela Fundação João
Pinheiro, em 2007, o déficit habitacional em Minas Gerais é de 721 mil moradias
e na região metropolitana de Belo Horizonte de 173 mil. A Prefeitura de BH
aponta que são 62 mil famílias sem casa na cidade, no entanto, militantes dos
movimentos afirmam que os mais de 200 mil cadastrados no programa Minha Casa,
Minha Vida apontam para a real necessidade.
“Não
existe mais política habitacional em BH. Tinha um esboço do que poderia ser, o
orçamento participativo da habitação, que nasceu com a administração do Patrus
em 93. E foi perdendo qualquer capacidade de atender o déficit habitacional”,
conta Joviano. Ele conta que a única coisa que há é o programa Minha Casa Minha
Vida, que ele diz que está nas mãos de empresários. “Não vemos isso como uma
política habitacional. É política econômica, pode ser considerada eleitoreira,
mas com certeza não está preocupada em resolver o déficit habitacional”,
critica.
Votação feita à revelia
Apesar de
conselheiros terem apontado a possibilidade de adiar a votação do ponto sobre
tempo mínimo de moradia para acesso a políticas de habitação, na reunião do dia
8, representantes do poder público passaram o ponto e aprovaram os cinco anos.
Durante a votação, foi pedido que o ponto passasse a ser discutido na 7°
Conferência de Habitação, que será realizada em junho. No entanto, o debate não
foi considerado pelo presidente do Conselho. “Eles não abriram a discussão e
não explicaram o porquê. Ele [presidente do Conselho, Coronel Bicalho] impôs a
votação”, conta Cleusa do Nascimento, do Centro de Apoio aos Sem Casa da
Arquidiocese de BH.
Movimentos
denunciam que o Conselho de Habitação não é paritário, ou seja, tem mais
votantes do poder público do que da sociedade civil, quando deveria ser a mesma
quantidade. “Acaba que a Prefeitura e os empresários têm a maioria dos votos.
De 20 conselheiro, eles têm pelos menos 12 votos. A votação foi legítima, mas
faltou discussão. Vamos tentar reverter dentro do próprio conselho, após debate
na Conferência”, diz Bruno Vieira.