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13/10/2014
por Breno Altman
VOTO DE ESQUERDA
DECIDIRÁ ELEIÇÃO
PRESIDENCIAL
A adesão de Marina Silva ao
candidato tucano, Aécio Neves, consolida o bloco de centro-direita no cenário
eleitoral. Trata-se do capítulo final de um enredo que começou a ser
escrito há dois anos, nos centros de comando da oposição ao governo petista.
Parte da burguesia
e de seus braços midiáticos imaginou que o PT somente poderia ser derrotado por
uma dissidência dentro de seu próprio campo, que trouxesse os principais
partidos de direita a reboque em eventual segundo turno. A operação apresentava
contornos parecidos com a estratégia desfechada em 1994, quando Fernando
Henrique foi catapultado como nome capaz de liderar o reordenamento da coalizão
neoliberal, provisoriamente destroçada com o impedimento de Fernando Collor.
A candidatura de
Eduardo Campos nasceu com a marca dessa política, robustecida quando Marina
Silva aceitou ser vice-presidente na fórmula do PSB, depois de inviabilizada a
formação de seu partido. A ideia era que tal postulação impediria a vitória da
presidente Dilma Rousseff logo no primeiro turno, ao roubar franjas de seus
votos naturais. Se Eduardo fosse à segunda volta, teria o apoio
automático do PSDB e seus aliados. O drama, para o conservadorismo, era que a
atração dos sufrágios socialistas, caso Aécio Neves estivesse na cédula final,
era mais insegura.
A morte trágica do
ex-governador de Pernambuco mudou a posição das peças no tabuleiro. Marina
Silva, alçada à cabeça de chapa, rapidamente assumiu ampla dianteira nas
pesquisas. Fez, a partir de então, movimentos cujos zigues-zagues determinaram
seu apogeu e declínio.
Acenou para
setores progressistas do eleitorado, especialmente dos grandes centros urbanos,
que estavam cansados ou insatisfeitos com os governos petistas. Suas armas,
para esses segmentos, eram de ordem biográfica e narrativa, adotando um
discurso melífluo de conexão com os movimentos juvenis eclodidos em junho de
2013. Ao mesmo tempo, tratou de ocupar o máximo de espaço à direita, mesclando
tanto a assimilação do programa econômico do neoliberalismo quanto a convocação
subliminar do voto evangélico, entre outros trunfos.
Sua posição de
vanguarda nas sondagens de opinião, por fim, também permitiu a sedução
passageira do eleitorado tucano menos fiel, inclinado a apoiar qualquer nome
capaz de derrotar o PT.
Primeiro turno: declínio de Marina Silva
Quando a campanha
de Dilma começou a polemizar com as opções programáticas de Marina, vinculando
a candidatura neossocialista à plataforma do capital financeiro e ao campo do
conservadorismo, uma fração dos votantes marinistas, mais à esquerda, acabou
retornando ao leito petista. Imediatamente se produziu declínio da ex-senadora
nas enquetes, suficiente para o voto útil conservador regressar a Aécio.
O resultado do
primeiro turno, apesar de tantos sobressaltos na campanha, acabou apresentando
resultado político semelhante a 2010, mas com certo esvaziamento da atual
presidente. Dilma caiu de 46,91% dos votos válidos para 41,59%. Aécio teve
33,55% dos sufrágios, contra 32,61% de José Serra há quatro anos. Marina Silva
subiu de 19,33% para 21,32%. Os partidos menores foram de 1,15% para 3,54%, com
forte crescimento do PSOL de Luciana Genro, que obteve 1,55% contra 0,87% do
postulante Plínio de Arruda Sampaio em 2010.
O cenário
apontaria para fácil vitória de Dilma no segundo turno se as condições
econômicas e políticas fossem as mesmas de 2010, quando o PT atraiu metade dos
votos de Marina e sua candidata venceu com 56% dos votos. Mas o fato novo das
eleições correntes é a existência de uma potente onda conservadora, que se
manifesta na maior facilidade de convencimento dos eleitores de centro pela
direita, particularmente através da ação dos principais meios de comunicação.
Ao contrário do
que se poderia apostar há alguns meses, o principal partido direitista, o PSDB,
é capaz de liderar uma aliança que absorve o PSB de Marina e outras agremiações
menos relevantes. Menos por suas virtudes, mais porque a fórmula de centro,
dessa vez, não era uma terceira via como eventualmente o foi em 2010, mas
hipótese orgânica de fatias burguesas agora reunificadas sob a chapa tucana.
Segundo turno: identidade de esquerda
São muitos os
sinais que a candidata do PT somente vencerá as eleições se aprofundar sua
identidade de esquerda e popular, prosseguindo e ampliando o movimento já
realizado no primeiro turno. O candidato da direita, apoiado pelo centro, corre
para mostrar que as principais conquistas sociais não estão em risco. A
presidente precisa apontar claramente, através da história e do programa,
porque a vitória do PSDB significa a derrocada das mudanças iniciadas em 2003.
Aécio precisa diluir as diferenças com o campo progressista para vencer. Dilma
somente será vitoriosa se demarcar radicalmente essas fronteiras.
A vitória petista
pressupõe a manutenção dos 43 milhões de votantes do primeiro turno e a
conquista de outros nove milhões de eleitores. Quase dois milhões podem vir da
extrema-esquerda. Outros 7 ou 8 milhões terão que sair do marinismo, o que
equivale a um terço dos que sufragaram a candidata do PSB na primeira volta.
Pode-se supor que
esse contingente, em sua maioria, votou por Dilma na última rodada de 2010, não
possui raízes conservadoras ou antipetistas, não está sob hegemonia dos
paradigmas da direita. Suas fileiras estão constituídas por setores sociais,
proletários e médios, que se desencantaram com o gradualismo petista e sua
capacidade de oferecer respostas imediatas às más condições e perspectivas de
vida nas grandes cidades. Suas expectativas não são de menos Estado e mais
mercado, ao contrário: mobilizaram-se por mais serviços públicos e menos
concessões aos interesses do capital.
Estratégia de confronto
Para dirigir os
votos dessas camadas, o petismo depende de uma firme estratégia de confronto. A
comparação dos doze anos dos governos de Lula e Dilma com os oito de gestão
tucana é parte essencial dessa equação, mas insuficiente.
O enfrentamento
provavelmente só será bem-sucedido se incluir a disputa programática, que
marque a candidatura tucana como a representação das elites e dos ricos contra
os pobres, a justiça social, a soberania nacional, os direitos civis e a
democracia, valores a serem coluna vertebral da plataforma petista.
A recuperação
destes eleitores de Marina Silva para o campo progressista não se restringe a
propostas que possam atender a demandas específicas, nas distintas áreas da
gestão pública. A propaganda antipetista dificilmente será vencida por
compromissos de serviço e eficácia, ainda que esses sejam fundamentais. A
disputa do centro – entendido em seu perfil político e social – depende da
polarização explícita e frontal entre dois projetos de país, que substitua a
tentação da alternância pela negação do retrocesso.
A argamassa da
direita, nesse momento, é o denuncismo anticorrupção, aproveitando-se de seu
domínio sobre os meios de comunicação e sobre o poder judiciário. Manter-se
nessa agenda, na qual a capacidade de fogo doconservadorismo é determinada por
seu poderio midiático, seria condenar a campanha petista à defensiva.
As urnas poderão
ser favoráveis ao PT se as ruas forem tomadas por um sentimento apaixonado de
resistência contra o retrocesso neoliberal, fundado sobre novo pacto
programático que faça avançar e aprofundar as reformas.