FCO.LAMBERTO FONTES
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04/09/2016
Golpe 'made in USA':
Queda de Dilma foi
ordenada por Wall Street?
Especialista canadense fala
sobre os objetivos do golpe de Estado
Em artigo publicado pela primeira vez em junho, mas
reeditado neste 1º de setembro, um dia após a consumação do impeachment no
Brasil, o renomado professor e economista canadense Michel Chossudovsky explica
por que a queda de Dilma foi ordenada por Wall Street e tenta desmascarar
“os
atores por trás do golpe”.
“O controle sobre
a política monetária e a reforma macroeconômica eram os objetivos últimos do
golpe de Estado. As nomeações principais do ponto de vista de Wall Street
são o Banco Central, que domina a política monetária e as operações de
câmbio, o Ministério da Fazenda e o Banco do Brasil”, diz o artigo, ressaltando
que, desde o governo FHC, passando por Lula e Temer, Wall Street tem exercido
controle sobre os nomes apontados para liderar essas três instâncias
estratégicas para a economia brasileira.
“Em nome de Wall
Street e do ‘consenso de Washington’, o ‘governo’ interino pós-golpe de Michel
Temer nomeou um ex-CEO de Wall Street (com cidadania dos EUA) para dirigir o
Ministério da Fazenda”, diz o artigo, referindo-se a Henrique Meirelles,
nomeado em 12 de maio.
Como observa o artigo, Meirelles, que tem dupla
cidadania Brasil-EUA, serviu como presidente do FleetBoston Financial (fusão do
BankBoston Corp. com o Fleet Financial Group) entre 1999 e 2002 e foi
presidente do Banco Central sob o governo Lula, entre 1º de janeiro de 2003 e
1º de janeiro de 2011. Antes disso, o atual ministro da Fazenda, que volta ao
poder sob o governo Temer após ter sido dispensado por Dilma em 2010, também
atuou por 12 anos como presidente do BankBoston nos EUA.
Reportagem
analisa que Henrique Meirelles, atual ministro da Fazenda, que volta ao poder
sob o governo Temer após ter sido dispensado por Dilma em 2010, também atuou
por 12 anos como presidente do BankBoston nos EUA
Já o atual presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn,
nomeado por Temer em 16 de maio, tem dupla cidadania Brasil-Israel e foi
economista-chefe do Itaú, maior banco privado do Brasil. Segundo o artigo,
Goldfajn “tem laços estreitos tanto com o FMI [Fundo Monetário Internacional]
quanto com o Banco Mundial”.
“Goldfajn já havia trabalhado no Banco
Central sob Armínio Fraga, bem como sob Henrique Meirelles. Ele tem estreitos
laços pessoais com o prof. Stanley Fischer,
atualmente vice-presidente do Federal Reserve dos EUA [além de ex-vice-diretor
do FMI e ex-presidente do Banco Central de Israel]. Desnecessário dizer que a
nomeação de Golfajn ao Banco Central foi aprovada pelo FMI, pelo Tesouro dos
EUA, por Wall Street e pelo Federal Reserve dos EUA”, afirma o artigo. Fraga,
por sua vez, atuou como presidente do Banco Central entre 4 de março de 1999 e
1º de janeiro de 2003. Ele foi diretor de fundos de cobertura (hedge
funds) por seis anos na Soros Fund Management (associada ao magnata George
Soros), e também tem dupla cidadania Brasil-EUA.
“O sistema
monetário do Brasil sob o real é fortemente dolarizado. Operações da dívida
interna são conducentes a uma dívida externa crescente. Wall Street tem o
objetivo de manter o Brasil em uma camisa de força monetária”, explica o
professor canadense.
Por isso, afirma
o artigo, quando Dilma Rousseff aponta um nome não aprovado por Wall Street
para a presidência do Banco Central, a saber, Alexandre Antônio Tombini,
cidadão brasileiro e funcionário de carreira no Ministério da Fazenda, é
compreensível que os interesses financeiros externos se articulem aos
interesses das elites brasileiras para mudar o quadro político no
país.
Contexto histórico No início de 1999, na sequência imediata do
ataque especulativo contra o real, diz Chossudovsky, o presidente do Banco
Central, Francisco Lopez (que havia sido nomeado em 13 de janeiro de 1999, a
Quarta-feira Negra) foi demitido pouco depois e substituído por Armínio Fraga,
cidadão americano e funcionário da Quantum Fund de George Soros em Nova York.
"A raposa tinha sido nomeada para tomar conta do galinheiro", resume
o artigo, afirmando que, com Fraga, os especuladores de Wall Street tomaram o
controle da política monetária do Brasil.
Sob Lula, o
apontamento de Meirelles para a presidência do Banco Central do Brasil dá
seguimento à situação, diz o artigo, destacando que o nomeado já havia atuado
anteriormente como presidente e CEO dentro de uma das maiores instituições
financeiras de Wall Street. “A FleetBoston era o segundo maior credor do
Brasil, após o Citigroup.
Para dizer o mínimo, ele [Meirelles] estava em
conflito de interesses. Sua nomeação foi acordada antes da ascensão de Lula à
presidência”, escreve o autor.Além disso, Meirelles foi um firme defensor do
controverso Plano Cavallo da Argentina na década de 1990: “um ‘plano de
estabilização’ de Wall Street que causou grandes estragos econômicos e
sociais”, segundo o professor Chossudovsky.
De acordo com
ele, “a estrutura essencial do Plano Cavallo da Argentina foi replicada no
Brasil sob o Plano Real, ou seja, a imposição de uma moeda nacional conversível
dolarizada. O que este regime implica é que a dívida interna é transformada em
uma dívida externa denominada em dólar”.
Quando Dilma sobe à presidência em
2011, Meirelles é retirado da presidência do Banco Central. Como ministro da
Fazenda de Temer, ele defende a chamada “independência do Banco Central”.
“A aplicação deste conceito falso implica que o governo não deve intervir nas
decisões do Banco Central. Mas não há restrições para as ‘Raposas de Wall
Street’”, diz o artigo, acrescentando que “a questão da soberania na política
monetária é crucial” e que “o objetivo do golpe de Estado foi negar a soberania
do Brasil na formulação de sua política macroeconômica”.
De fato, sob o
governo Dilma, a "tradição" de nomear uma “raposa de Wall
Street" para o Banco Central foi abandonada com a nomeação de Tombini, que
permaneceu no cargo de 2011 até maio de 2016, quando Temer assume a presidência
interina do país. A partir daí, Meirelles, no Ministério da Fazenda do
governo interino, “aponta seus próprios comparsas para chefiar o Banco Central
[Goldfajn] e o Banco do Brasil [Paulo Caffarelli]”, diz o artigo do Global
Research, sublinhando que o novo ministro havia sido descrito pela mídia dos
EUA como "market friendly" (“amigo do mercado”).
Conclusão
“O que
está em jogo através de vários mecanismos – incluindo operações de
inteligência, manipulação financeira e meios de propaganda – é a
desestabilização pura e simples da estrutura estatal do Brasil e da economia
nacional, para não mencionar o empobrecimento em massa do povo brasileiro”,
afirma Chossudovsky. Segundo a tese do renomado professor, “Lula era
‘aceitável’ porque seguiu as instruções de Wall Street e do FMI”, mas
Dilma, com um governo mais guiado por um nacionalismo reformista soberano, não
pôde ser “aceita” pelos interesses financeiros dos EUA, apesar da agenda
política neoliberal que prevaleceu sob seu governo.
“Se Dilma tivesse
decidido manter Henrique de Campos Meirelles, o golpe de Estado muito
provavelmente não ter ocorrido”, afirmai o analista. “Um ex-CEO/presidente de
uma das maiores instituições financeiras dos Estados Unidos (e um cidadão dos
EUA) controla instituições financeiras-chave do Brasil e define a agenda macroeconômica
e monetária para um país de mais de 200 milhões de pessoas.
Chama-se um golpe
de Estado… dado por Wall Street”, conclui Chossudovsky.
Michel Chossudovsky,
escritor premiado, é professor (emérito) de Economia da Universidade de Ottawa,
fundador e diretor do Centro de Pesquisa sobre a Globalização (CRG) e editor da
organização independente de pesquisa e mídia Global Research. Ele lecionou como
professor visitante na Europa Ocidental, no Sudeste Asiático e na América
Latina, serviu como conselheiro econômico para governos de países em
desenvolvimento e tem atuado como consultor para várias organizações
internacionais.
Ele é o autor de onze
livros, publicados em mais de vinte línguas. Em 2014, foi premiado com a
Medalha de Ouro de Mérito da República da Sérvia por seus escritos sobre a
guerra de agressão da OTAN contra a Iugoslávia.