SEXTA-FEIRA, 26 DE ABRIL DE 2013
MARINA
SILVA
Abril, outra vez
A gestão clientelista do
Estado está levando o Brasil a uma crise institucional. Os vícios derivados do
fisiologismo, antigos e arraigados na política, foram exagerados nos últimos
anos a ponto de prejudicar o coração da República.
O Congresso Nacional, especialmente
a Câmara dos Deputados, arrisca-se a institucionalizar uma ocupação perversa da
chamada "máquina pública" para beneficiar aliados e perseguir
adversários.
O prejuízo na identidade
do parlamento é evidente: o lugar de resistência histórica contra o
autoritarismo sendo usado como base de operações patrimonialistas de quem se
acha dono de tudo e quer ser dono do resto. A atual legislatura tem pouco tempo
para evitar ser caracterizada como a legislatura do retrocesso, dedicada a
destruir os avanços institucionais que ali mesmo foram construídos desde a
redemocratização e a Constituinte.
Começando pelos mais
indefesos, que não tem "bancada", foram acolhidas várias iniciativas
para desmontar a legislação que protegia o patrimônio ambiental e as comunidades
indígenas e tradicionais. Em seguida, tudo o que constitui direito comum passou
a ser alvo de desregulamentação.
Assim, chegamos ao que vem
sendo chamado de "novo pacote de abril", em referência a um triste
episódio da ditadura militar. Ensaia-se uma completa regressão política e
institucional.
Na pauta do retrocesso
está a PEC 37. Conhecida como "da impunidade", retira o poder de
investigação do Ministério Público, responsável pela descoberta e julgamento de
alguns dos principais crimes de corrupção nos últimos anos. Em apenas três
países os promotores não podem conduzir investigações --e talvez por isso
tenham dificuldade de manter regimes democráticos.
O Brasil não deve entrar
nesse time.
E na CCJ, os deputados
aprovaram projeto em que se tornam revisores das decisões do STF. A presença de
parlamentares condenados no "mensalão" mostra o tamanho da ousadia:
os sentenciados se reúnem após o julgamento para validar ou não a decisão do
juiz.
Quando me falavam sobre a
tentação autoritária de alguns setores da esquerda latino-americana, eu dizia
que no Brasil não havia ambiente para essas aventuras. Com tantas velhas
mentiras pintadas como novas verdades penso que devemos ficar de olhos abertos.
Os senadores que ousaram
manter os princípios democráticos derrotaram a "urgência" com que o
governo queria prejudicar a formação de partidos que não estarão na sua base. O
STF ouviu o apelo dos que resistiam e interrompeu o golpe.
Mas foi apenas um
dia da caça.
Como nem todos democratas
de outrora resistem ao caçador da democracia que escondem atrás de si, é
preciso repetir, como antigamente: a luta continua.