Cristovam Buarque
Superação do atraso
só com um
salto educacional
Em 1961, os Estados Unidos definiram a meta
de enviar um homem à Lua no prazo de dez anos. Cinquenta e dois anos depois, o
governo brasileiro definiu a meta de alfabetizar suas crianças de oito anos até
2022. Talvez nada demonstre mais o nosso atraso do que a diferença entre essas
duas metas. E o governo comemora com fanfarras, em vez de pedir desculpas pelo
atraso do Brasil.
Nesta segunda década do século XXI, os países que desejam estar sintonizados com o futuro têm como metas, dentre outras, a conquista do espaço, o entendimento das ciências biológicas, o desenvolvimento de técnicas de telecomunicações, a implantação de sistemas industriais sintonizados com os avanços técnicos.
Fica impossível imaginar uma sociedade do conhecimento
sem centros de pesquisa e um amplo sistema universitário de qualidade. Isso só
é possível se a educação de base for de alta qualidade para todos. E isso é
impossível sem a alfabetização universal e completa em idades precoces, que
garantam não apenas o controle dos códigos alfabéticos, mas também a leitura e
o domínio das bases da matemática. Na economia do conhecimento, nenhuma
sociedade pode deixar de desenvolver o potencial do cérebro de cada um de seus
habitantes desde os primeiros anos, desde a alfabetização.
Mas não é isso o que vem acontecendo com o Brasil. Ao não
fazer a universalização da educação completa, o país tapa poços de
conhecimento. Imagine os EUA fazendo um pacto entre seus Estados para ver qual
deles chegaria à Lua, em vez de usar a Nasa federal.
Se o Brasil deseja recuperar seu atraso, deve definir
metas nacionais ambiciosas: todas as crianças na escola em horário integral,
com professores muito bem-preparados e dedicados, o que exige elevados
salários, em escolas com os mais modernos equipamentos pedagógicos, em todo o
território nacional, desde os mais ricos aos mais pobres municípios, atendendo
igualmente às crianças mais ricas e às mais pobres.
Isso não se consegue por meio de pactos ilusórios,
assinados sem qualquer compromisso real das partes, especialmente entre partes
tão desiguais, que levam os pactos a parecerem caricaturais.
A única maneira de recuperar os séculos perdidos no
passado para dar o salto que o Brasil precisa no futuro é envolver diretamente
a União na implantação de um novo sistema educacional para, ao longo de poucos
anos, substituir o atual sistema estadual e municipal por um sistema federal.
Isso exige mais do que um pacto ilusório. Exige uma espécie de federalização da
responsabilidade e da construção do novo sistema educacional.
O Brasil não dará o salto educacional, e sem este não
haverá os outros, sem um governo federal que empolgue o país com a meta de, em
20 ou 30 anos, ter uma educação de qualidade comparável à dos países mais
educados do mundo. Isso é possível e é preciso.