21/07/2013
janio de freitas
Pensar é
preciso
DE SÃO PAULO
A coisa foi menos simples no seu começo e é
menos simples, na continuação pelo país afora, do que se tem dito, com maior ou
menor pose. Foi muito pouco dizer que os delinquentes que atacaram o Congresso
e o Itamaraty eram baderneiros e pronto. O mesmo sobre os delinquentes que
investiram contra a Prefeitura de São Paulo e sobre os que tentaram incendiar a
Assembleia Legislativa no Rio ou, agora, atacaram no Leblon.
Tais façanhas não são só de
"lúmpen" e baderneiros típicos. Os modos e perfis característicos da
delinquência contaminaram grande parte das classes médias, como se pode e não
se quer ver até em certos territórios universitários. E isso significa algo
muito sério e profundo.
A simplificação deturpadora não
é menor quanto à parcela social que se diz estar no exercício pleno da
democracia em suas manifestações. Os acontecimentos ainda vivos do Leblon dão
um bom exemplo. É só vê-los com a necessária ótica de que democracia não é o direito
de exprimir qualquer coisa, em qualquer tempo, de qualquer maneira. Há
condições e respeitos a serem considerados.
Manifestação em frente ao
apartamento de Sérgio Cabral, por exemplo, pode ser um exercício de liberdade
democrática, mas pode não ser mais do que uma atitude de autoritarismo. Cabral
não é tolo de ficar em casa: está há tempos em endereço não conhecido. Mas seus
vizinhos precisam ficar. Com a manifestação infrutífera, todo o trânsito desde
o centro da cidade até a Barra da Tijuca, no outro extremo, reduz-se a um
engarrafamento que triplica, ou mais do que isso, o tempo de volta do trabalho
--não só em carros de luxo, não, também em centenas ou milhares de ônibus a
serviço de todas as classes sociais.
Por que não o protesto no
palácio de governo, se o alvo é o governador e não o familiar, o vizinho e o
transeunte? Os efeitos urbanos, embora muito menores, são parecidos com os do
Leblon. Mas a lógica do direito democrático de protestar os justifica, dado
serem onde e como devem ser. Democracia dá trabalho, e um deles é ponderar, em
tempo, o sentido social e o limite de cada ação pública.
Parece que estamos dispensados
dessa obrigação. Os deslimites vêm de todos os lados. Todos em nome da
democracia e de direitos.
Ainda o exemplo do Leblon: em
nome da democracia, uma reunião de promotores, OAB e Anistia Internacional, na
semana passada, recomendou à PM contenção nas ações repressivas aos
baderneiros, em especial no uso de bombas de gás; agora a recomendação à PM, em
nome da democracia, é de que não permita baderna. Então, para livrar a cara,
vem o acréscimo: "mas sem excessos". E o que seriam esses excessos
diante da violência delinquente? Ninguém diz, nem diz como deve ser a
repressão. Basta falar em nome da democracia. A simplificação em nome da
democracia é um risco de antidemocracia.
OS CELULARES
A ministra Tereza Campello, do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome, esclarece que não haverá exigência de
posse de celular pelos beneficiários da Bolsa Família. O pretendido, e não bem
explicitado na sua entrevista publicada a respeito, é que o gestores do
programa peçam aos beneficiários que sempre anotem o número do celular, se o
tiverem na família --caso de mais da metade dos inscritos no programa.
O PODER
Onde ficou a ética? Essa é a
questão no ato do ministro Joaquim Barbosa que suspende, por liminar, a criação
de quatro Tribunais Regionais Federais pelo Congresso. Antes da votação
parlamentar, o ministro abriu um confronto com os favoráveis à criação, e foi
vencido. Com a circunstância do seu cargo de presidente do Supremo, impõe uma
liminar que podia esperar por outro ministro, ao fim do recesso do Judiciário.
Janio de Freitas, colunista e membro do Conselho Editorial da Folha, é um dos mais importantes jornalistas brasileiros. Analisa com perspicácia e ousadia as questões políticas e econômicas. Escreve na versão impressa do caderno "Poder" aos domingos, terças e quintas-feiras.
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