Publicado em 05/08/2013
Esquema
Siemens também operou
em
administração de tucano mineiro
Empresário acusou a ECT de superfaturamento de R$ 48 milhões em
licitação promovida no governo FHC tendo como ministro Pimenta da Veiga
Em
meio ao escândalo do chamado propinoduto tucano, denunciado pela Siemens,
empresas fornecedoras de equipamentos e de serviços em trens e metrô nas
gestões Mario Covas, José Serra e Geraldo Alckmin que superfaturaram R$ 577
milhões, o equivalente a 30% a mais do que os governos pagariam se não houvesse
esquema, outros casos envolvendo a empresa igualmente estão sendo investigados,
mas ainda permanecem ofuscados.
Até
2005, repousou em uma gaveta do empresário catarinense Edson Maurício Brockveld
um envelope lacrado de papel pardo. Em uma das faces do invólucro estão
registradas cinco assinaturas de membros da Comissão Especial de Licitação dos
Correios. Dentro, segundo ele, está à prova de que a corrupção na ECT começou,
ou tinha prosseguimento, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso.
Dono da Brockveld Equipamentos e Indústria Ltda., o
empresário esperou até 2005, ocasião da CPMI dos Correios para abrir
publicamente o envelope. Seu objetivo era provar ter sido preterido em uma
concorrência, em 2000, em favor de duas empresas estrangeiras, a alemã Siemens
e a francesa Alstom, ambas com propostas supostamente superfaturadas.
Brockveld alega ter calculado em R$ 48 milhões o
contrato de compra de equipamentos de movimentação e triagem de carga interna
oferecido à ECT. A dupla vencedora cobrou quase o dobro. De quebra, diz o
empresário, as escolhidas passaram a gerenciar outros três contratos no valor
de US$ 100 milhões (R$ 230 milhões).
Em 22 de dezembro de 1999, a ECT abriu a
concorrência internacional 016/99 para compra e manipulação de equipamentos de
sistemas de movimentação e triagem interna de carga. Interessado no negócio,
Edson Brockveld conta que, nos dois anos anteriores à licitação, desenvolveu,
junto ao setor de engenharia dos Correios, diversos equipamentos e realizou
testes em parceria com as empresas Portec e Buschman, ambas dos Estados
Unidos.
Segundo ele, a pedido da diretoria da ECT, a
Brockveld Equipamentos chegou a trazer engenheiros americanos para fazer as
demonstrações e, assim, ganhar a confiança da direção da estatal. O presidente
da empresa era Hassan Gebrin, ligado aos grupos políticos do então governador
do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PMDB), e do ex- senador e ex-governador
também do Distrito Federal José Roberto Arruda (PFL-DF).
A indicação havia sido avalizada pelo então
ministro das Comunicações, Pimenta da Veiga. Para garantir uma boa posição no
processo licitatório, a Brockveld fez um consórcio com a japonesa NEC, uma das
gigantes mundiais do setor de tecnologia de ponta. Pelo acordo, cada empresa
seria responsável por um setor.
A empresa brasileira cuidaria do maquinário de
movimentação postal e a NEC dos equipamentos de comunicação e segurança. Dois
dias antes da licitação, no entanto, sem nenhum sinal prévio, conta Edson, o
então diretor da NEC no Brasil, Marcos Sakamoto, informou à Brockveld que não
poderia participar da licitação.
Alegou, segundo o empresário catarinense, atender a
um pedido da direção da Siemens, que não queria a participação das duas empresas
na licitação. No dia da abertura das propostas, Edson Brockveld diz ter sido
diretamente convidado pelas empresas Mannesmann Dematic Rapistan, Siemens e
Alstom a não participar da concorrência da ECT, pois estaria tudo certo que as
duas últimas seriam as vencedoras da licitação.
Brockveld alega ter ignorado a oferta e
participado, assim mesmo, do processo. No dia da licitação, o edital previa que
fossem abertos os envelopes relativos à habilitação técnica e comercial. Porém,
ao ser constatado que a Brockveld Equipamentos iria participar da licitação, e
pelo fato de os concorrentes não saberem se a empresa estava ou não com os
documentos em ordem, foi feita uma proposta à ECT de emissão de um parecer
único da proposta técnica e de habilitação, em desacordo com o estabelecido no
edital de licitação.
Feito isso, a Brockveld e a Mannesmann acabaram
sumariamente inabilitadas tecnicamente. A Mannesmann imediatamente recorreu,
mas teve o pedido indeferido. Ambas receberam, lacrados, os envelopes com as propostas
de volta. Siemens e Alstom foram às escolhidas. Detalhe: a empresa francesa
embolsou US$ 15 milhões e deu o cano na ECT, por este motivo foi processada
pelos Correios e substituída em seguida, pela NEC.
Logo depois, a direção da Brockveld foi procurada
pelas empresas vencedoras. Teriam pedido para que ela não entrasse com recurso
administrativo. Em troca, os executivos da Siemens e da Alstom dariam parte do
projeto para a perdedora. Ou seja, comprariam da empresa brasileira os
equipamentos previstos no contrato.
Com a Alstom, o acordo foi assinado na noite do dia
23 de fevereiro de 2000. A empresa foi representada, segundo Edson Brockveld,
por um diretor chamado Jean Bernard Devraignes. A Siemens, no entanto, esperou
a data-limite para entrada de recurso, 24 de fevereiro de 2000, para assinar o
acordo, em Brasília.
Naquele dia, para ter certeza de que tudo sairia
conforme combinado, Hélcio Aunhão, diretor da Siemens, foi ao aeroporto da
capital federal encontrar com Brockveld, então disposto a entrar com o recurso
administrativo contra o resultado da licitação, o que nunca aconteceu. Depois
de assinados os contratos, no entanto, as empresas vencedoras não honraram os
acordos.
Edson Brockveld, então, esperou o momento certo de
se vingar. A crise desencadeada a partir das denúncias de corrupção, justamente
nos Correios, lhe pareceu à oportunidade ideal. O empresário foi ao Congresso
Nacional para entregar toda a documentação sobre o caso a então senadora, hoje
ministra Ideli Salvatti.
Disse a ela ter tomado a iniciativa de denunciar o
caso cinco anos depois porque, impedido de participar da licitação e traído por
empresas internacionais, achava que a CPMI dos Correios iria se interessar pelo
caso. Por isso havia decidido ir pessoalmente ao Senado. Ele disse à senadora
que, em princípio, não teria interesse em entrar em briga judicial contra a
ECT, mas pretendia acionar a Siemens e a Alstom por quebra de contrato.
O diretor-regional de Vendas da Siemens no Brasil,
Hélcio Aunhão, negou, na Sub-relatoria de Contratos da CPMI dos Correios, as
acusações de que a empresa teria feito conluio com a Alston para que a
Brockveld se retirasse da licitação do sistema de triagem interna de cargas dos
Correios.
Aunhão confirmou ter assinado termos de intenção de
compra de alguns equipamentos com a Brockveld, transação que, segundo Edson
Maurício, serviria para compensar a empresa que se retirou, mas disse que a
compra não foi realizada porque a empresa fornecedora não teria cumprido as
condições estipuladas no contrato.
O sub-relator, então deputado federal, hoje
Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, afirmou na audiência que a CPMI iria
solicitar ao Ministério Público o aprofundamento da investigação sobre o
caso.
O Ministério Público brasileiro obteve de
autoridades da Suíça, este ano, a confirmação da existência de contas do
operador do esquema junto ao Metrô de São Paulo, Roberto Marinho, no exterior.
Agora, espera-se no MP a chegada de novas informações, vindas do Principado de
Liechtenstein, vizinho à Suíça, de forma a rastrear o trânsito de grandes
recursos no circuito de empresas e bancos do paraíso fiscal.
Segundo as autoridades o alimentador desse esquema
seria a multinacional Alstom, que teria feito “acordo”, com os tucanos antes mesmo
da Siemens e em relação ao Metrô de São Paulo, ou seja, no período que ocorreu
às irregularidades no Correios, quando Pimenta da Veiga era Ministro das
Comunicações de FHC.
Na multinacional alemã, o presidente no Brasil,
Peter Loscher, foi afastado do cargo, numa responsabilização indireta sobre a
gestão que teria participado de um cartel formado por 15 empresas, todas
participantes de um esquema de pagamento de propinas aos tucanos.