sábado, 6 de setembro de 2014

MARINA SILVA, DEIXA TRANSPARECER A SUA VONTADE DE UM GOVERNO FASCISTA... O FUNDAMENTALISMO ADVINDO DE SUA FÉ RELIGIOSA, MOSTRA A AUSÊNCIA DE CONHECIMENTO NA SOCIEDADE ATUAL COM OS SEUS DESEJOS DAS PARTICIPAÇÕES DEMOCRÁTICAS...





postado em: 04/09/2014
Política

Rogério Dutra dos Santos (*)

Análise: 
Os sentidos ocultos 
de uma candidatura

Em termos pragmáticos, a “nova política” pregada pela candidata à presidência pelo PSB tem sido demolida desde a sua “apresentação” nas últimas semanas, embora a sua consistência já seja de conhecimento público há tempos. 

Financiada pela Natura e pelo Banco Itaú, orientada pelo mercado financeiro em suas propostas macroeconômicas e aberta às negociações e coalizões eleitorais, Marina Silva não traz nenhuma novidade. 

Pelo menos não é nova a estratégia para os que acompanharam a sua trajetória de saída do PT para uma candidatura à presidência no PV, em 2009. Ela, inclusive, não pulou do barco por problemas éticos, ou pela “nova política”, mas por já saber que a candidata preferencial de Lula era a Dilma. Mas a dita “nova política” quer significar, na ideação apresentada pela candidata, uma coisa completamente diferente. 

É sobre os significados “profundos” ou “ocultos” atribuídos à concepção de política cunhada por Marina Silva que é dedicado este texto.

Marina Silva entende que, na sua essência, a “nova política” a coloca acima do plano político e dos conflitos a ele inerentes. 

Entretanto, apesar de pertencer a outro nível político, ela é capaz de assumir um papel de protagonismo e de direção no mundo comezinho do jogo do poder. 

A primeira dificuldade de entender a “nova política” idealizada por Marina Silva é que ela não irá operar uma mediação entre interesses opostos e inconciliáveis – meio-ambiente e agronegócio, por exemplo –, cujo resultado seria uma síntese dialética. 

Ela não quer representar uma fusão destas oposições, pois assim fazendo, ela estaria reproduzindo a “velha política” do toma-lá-dá-cá.

Na entrevista ao JN nesta semana, questionada sobre a origem do jatinho da campanha, Marina Silva disse que a “nova política” significa a verdade, e que a verdade não vem “pelas mãos do partido” nem pela investigação da imprensa, mas “ela terá que ser aferida pela investigação que está sendo feita pela Polícia Federal”. 

Ou seja, a verdade surge da ação competente, pelas mãos do aparelho de Estado que ela pretende governar. Em outro momento, o entrevistador pergunta se a chapa Marina Silva e Beto Albuquerque – ligado a fabricantes de armas e de bebidas – não representaria a “união dos opostos tão comum à velha política, apenas para viabilizar uma chapa, apenas para viabilizar uma eleição”. 

A resposta de Marina Silva, como a sua explanação sobre a “nova política” durante o debate dos candidatos na Band, é a de quem paira acima dos partidos, das velhas “polarizações”: “– A nova política sabe trabalhar na diversidade e na diferença”.

Ao marcar a sua distância das polarizações e o seu papel diretivo na ordenação dos diferentes, Marina Silva quer representar uma espécie de dínamo agregador, capaz de abarcar todas as oposições do mundo material, mas sem desfazê-las. 

Ela quer coordená-las a partir de uma situação de supremacia formal/institucional, garantida pela escolha de sua pessoa como representante da “nova política”. 

Como líder política, acima dos partidos ou independentemente destes, a atual candidata se compreende portadora de uma vontade de decisão racional, e mesmo jurídica, apta a conformar a realidade.

Pode-se argumentar que o próprio PT, em 2002, utilizou-se da retórica do novo, como Marina Silva está fazendo. Lula também chamou a sua presença de novidade na política. 

Mas a sua plataforma e o seu discurso eram claramente antitéticos ao projeto de Serra e do PSDB. A clivagem era sólida e a polarização representava a demarcação entre duas realidades mensuráveis racionalmente. Assim, conclui-se que, na “velha política”, a realidade é racional. 

Ela pode ser totalmente transformada, sintetizada e alterada pelas mediações políticas, pela dialética da composição, sempre dentro da lógica da racionalidade.

Não é este o modelo político de Marina Silva. O caráter universal da “nova política” se diferencia da noção de totalidade racional, visto que nele a realidade disforme é preservada em suas oposições e inconsistências materiais, embora seja orientada por uma decisão racional da vontade de quem ordena. 

Assim, a razão não está no mundo, mas na ordem produzida pela “nova política”.

Veja-se o caso da matriz energética brasileira. Para Marina Silva, que entende atuar para as futuras gerações, preservar o meio ambiente é a verdade da “nova política”. 

Como conseqüência, a exploração do petróleo na camada do pré-sal deve ser revista. Seus resultados previstos devem ser considerados conjunturais: “Temos que sair da idade do petróleo. Não é porque falte petróleo. 

É porque encontraremos e já estamos encontrando outras fontes de suprimento de energia”.
 
No seu sistema “multimodal”, os investimentos na energia solar, eólica e no etanol devem ser priorizados, sem abandonar de todo o que ainda é “um mal necessário”.

A lógica aqui não é beneficiar os interesses geopolíticos norte-americanos, temerosos do crescimento estratégico do Brasil a partir da independência energética que o pré-sal prenuncia. Este seria um raciocínio apequenado, opaco, característico da “velha política”. 

Deriva não da essencialidade da representação verdadeira, mas das conveniências das delegações partidárias, parciais e geralmente corruptas. 

O que garante a ordem balanceada do universo, em convergência com o futuro da vida ecológica é a verdade da representação. Assim, segundo a “nova política”, a irracionalidade das oposições do mundo é gerida pela racionalidade assentada em quem representa. 

Os representados – e seus anseios por um mundo melhor, mais sadio e mais puro, que não são necessariamente compartilhados conscientemente – dependem da representação para existirem. Trocando em miúdos: na “nova política”, o real é irracional. 

A racionalidade é portada apenas pela representante, e somente se materializa no ato de suas decisões, ordenando e dando forma ao mundo.

Pairando acima da impotência cega da “velha política” e portando a vontade de decisão que falta ao país para “mudar a realidade de política brasileira” e para que este alcance o futuro, Marina Silva quer “governar com os melhores”. 

O recado no debate dos presidenciáveis não poderia ser mais direto. A sociedade brasileira, por via da “nova política” que Marina Silva representará e que se mobilizou em junho do ano passado, vai, enfim, poder “escalar uma nova seleção” de homens bons de todos os partidos. 

Para isto, basta eleger a candidata. Sacramentada e sacralizada pelas urnas, a “nova política” não falhará. Todas as suas decisões serão portadoras da verdade e da unidade concretas derivadas da representação.

Quais são os problemas da “nova política” da candidata Marina Silva? O primeiro é que esta “nova política” é uma velha conhecida dos reacionários alemães. Está detalhadamente exposta na obra do jurista e politólogo alemão Carl Schmitt. 

As teses de Schmitt serviram, dentre outras serventias, para fundamentar o regime nazista. Não se trata de dizer que a “nova política” flerta com o nazismo, mas que a estrutura da representação idealizada pelo discurso de Marina Silva é muito próxima das teses de Schmitt. 

E a representação política, nos termos estabelecidos por Schmitt – e explicitados acima, sob o pseudônimo de “nova política” –, permite casar as ideias de democracia e ditadura. A infalibilidade da representação política schmittiana é a infalibilidade do Papa, representante de Cristo.

O segundo problema é que a “nova política” de Marina Silva flerta abertamente com a crítica aos partidos, a “velha política” das agremiações tradicionais, que se expressam no parlamento. O seu programa de governo defende, por exemplo, candidaturas sem partido. 

Este flerte é preocupante, visto que a implicação política da crítica aos partidos é a tese do partido único, em conjunto com a tese da desnecessidade do parlamento, o que também tem como consequência um modelo de Estado ditatorial.

O terceiro problema é que a “nova política” é a expressão de teses elitistas. E o elitismo, no plano político, é gêmeo univitelino do fascismo. 

Nesse sentido, as críticas ao discurso vago e ambíguo de Marina Silva, se aliadas ao seu desejo de escolher os melhores através de critérios também vagos e obscuros, têm como consequência o predomínio da autoridade de quem comanda, o que origina um governo fascista.

O quarto problema é o claro messianismo disso tudo. Marina Silva, com o discurso da “nova política” se coloca na posição de guia do futuro, de modeladora da realidade e de líder cujo destino de liderança foi atribuído à providência. 

Aliado às suas crenças religiosas, o messianismo de Marina Silva será suficiente para que ela desconheça os limites do sistema constitucional, se este ficar no caminho do futuro. Como demiurgo da ordem, a ela Marina Silva não se submete.

O quinto problema é que esta ideação de uma relação representativa calcada numa identidade substancial entre representante e representados não encontra respaldo na realidade. 

Marina Silva não foi capaz de produzir esta galvanização entre a “nova política” e os anseios de uma sociedade plural e complexa. 

Portanto, não há substrato material para justificar a construção de uma ordem orientada por valores não definidos e assentados numa relação de representação fluida.

O sexto e último problema levantado aqui é que subjaz, silente no discurso, a questão de que há interesses específicos e muitíssimo racionais financiando a candidata. 

Estes interesses não representam o futuro verde, nem a preservação do meio-ambiente, e também não representam o Brasil, visto que falam em nome de investidores e empresas multinacionais. 

Num mundo real, como garantir o futuro verde com o financiamento dos que o exploram selvagemente?

Se ganhar as eleições, Marina Silva não representará somente um problema de ordem econômica e financeira, nem mesmo deixará como legado o desmonte do Estado. 

O pior que pode acontecer é que a sua “nova política” signifique a destruição da democracia brasileira que, com tanta luta e com tanto sangue, o povo conquistou.
 
(*) Professor do Departamento de Direito Público da Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense. Doutor em Ciência Política pelo antigo IUPERJ.