quarta-feira, 10 de abril de 2013

Publicado em 09/04/2013
EDITORIAL: JOGO DO ADVERSÁRIO
Por Geraldo Elísio
Geraldo Elísio escreve no "Novojornal". Prêmio Esso Regional de jornalismo, passado e presente embasam as suas análises

“A César o que é de César a Deus o que é de Deus”. – Jesus Cristo

No futebol uma das recomendações dos técnicos é evitar que os jogadores do clube que ele eventualmente esteja dirigindo “entre no jogo do adversário” o que na maioria das vezes é fatal. Na política este princípio também pode ser utilizado. As redes sociais já entraram em ação e a presidenta Dilma Rousseff começa a perder pontos em função do comportamento do pastor Marcos Feliciano, homofóbico e racista a ponto de dizer que os africanos são amaldiçoados.
Como diria Jack “O Estripador”, vamos por partes. O pastor da Igreja Assembléia de Deus responde a processo por corrupção e já recebeu vários pedidos para renunciar, mas apega-se ao cargo como craca de navio e pretende se beneficiar de um evento da Assembléia de Deus em Brasília, com a presença prevista de 20 mil pastores que deverão, segundo a mídia, se manifestarem a favor dele. Vejam só a dimensão que o caso está ganhando.
Marcos Feliciano diante do imbróglio foi se aconselhar com outro colega, Renan Canalheiros, uma mistura de canalha com quadrilheiros, isto mesmo, aquele parlamentar que pagou a pensão alimentícia da filha dele, em relacionamento extra conjugal com a jornalista Mônica Veloso, com dinheiro do povo. E ouviu que deveria resistir. Canalheiros, além de ser ele próprio um problema, ajudou a consolidar outro para dona Dilma e também para a Assembléia de Deus.
Indaga-se: a Assembléia de Deus é a favor do relacionamento extraconjugal ou pastor deputado em vez de ouvir a palavra de Deus deve se aconselhar com um corrupto pecador como Renan. No caso podemos mesmo dizer que “gambá cheira gambá”, e acrescentar de passagem que o cheiro é fétido.
Mais ainda, o mundo inteiro reverencia o arcebispo sul africano Desmond Tutu, que é negro, pertence a uma Igreja reformada, a Anglicana, conseqüentemente evangélica e que adota a mesma Bíblia com ensinamentos dos mesmos evangelistas e ainda por cima é Prêmio Nobel da Paz. Indaga-se: o pastor Marcos Feliciano e a Igreja Assembléia de Deus entendem que o arcebispo Desmond Tutu e todos os conterrâneos dele, de todo o continente negro “são amaldiçoados”? Não sou teólogo, mas os pastores da Igreja Assembléia de Deus poderão me responder: qual a cor de Deus? E quando Jesus Cristo disse “vinde a mim as crianças porque delas é o Reino dos Céus”, acrescentando que quem não se parecer com elas lá não terá entrada, Ele excluiu as crianças negras senhores pastores?
Em outro vídeo que circula nas redes sociais, o pastor Marcos Feliciano atribui a Deus o assassinato do ex-beatle John Lennon em função dele ter afirmado que o conjunto de rock inglês era tão popular quanto Jesus Cristo. Indagação ao pastor Marcos Feliciano e à Igreja Assembléia de Deus: o Deus que é a perfeição Suprema em sua onisciência pode ser atingido pela vaidade, pelo rancor ou qualquer outro sentimento negativo incompatível com a deidade dele? O item seis dos Dez Mandamentos, “Não Matará”, ainda esta em período de validade? Ou Deus contrata sicários, porquê a morte de Lennon não foi natural, foi crime. O item que fala “Não furtará” – Marcos Feliciano é acusado de corrupção também tem validade?
Martin Luther King, um negro pastor da Igreja Batista Ebenezer, igualmente uma igreja reformada, de Atlanta, nos Estados Unidos, reverenciado no mundo inteiro por sua luta a favor dos direitos sociais dos negros daquele país, assassinado quando organizava uma marcha de Mempfis (Tennessee) a Washington, perdeu a vida porquê Deus mandou matá-lo?  O pastor Jesse Jacson, auxiliar de King, também da Igreja Batista e como ele admirado pelas mesmas razões “são amaldiçoados?” Eles jamais disseram que os negros carregam este fardo.
Mas voltemos a dona Dilma Rousseff que errou na escolha tanto de Renan Canalheiros e de Marcos Feliciano e permitiu o mal crescer. Agora duas de suas ministras entram na polêmica envolvendo diretamente o Planalto quanto à permanência ou não de Feliciano (PSC/SP) à frente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Comissão que funciona de portas fechadas o que por si só já é uma afronta aos direitos humanos. Eu tenho um Prêmio Esso Regional de Jornalismo denunciando torturas (1977) quando ainda vigia o AI-5. Isto é ou não considerado um trabalho a favor dos Direitos Humanos? E se eu quiser assistir a uma sessão da Comissão? Fico impedido? Não é uma afronta aos meus direitos humanos? À minha liberdade de expressão e informação?
Moção aprovada pelo Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial e assinada pela ministra Luiza Bairros, publicada no Diário Oficial da União, afirma que a indicação do pastor para o cargo contraria os propósitos da referida comissão porque "a trajetória e a postura do deputado em relação à população LGBT e à população negra se revelam preconceituosas e excludentes, causando insatisfação aos mais diversos segmentos sociais". No texto ainda se define como "inaceitável" a permanência dele na presidência.
Em visita a uma exposição sobre holocausto na Câmara, a ministra Maria do Rosário, dos Direitos Humanos, reforçou as críticas. "É lamentável que a cada dia nos deparemos com mais um pronunciamento, mais uma intervenção que incita o ódio, o preconceito, algo que já ultrapassa as barreiras da comissão na Câmara e diz respeito a todos", disse a ministra. "A Câmara certamente encontrará uma solução ou o próprio Ministério Público porque incitar a violência e o ódio é atitude ilegal, inconstitucional e as autoridades também estão sujeitas à lei", afirmou.
Creio eu a saída correta é a retirada de Marcos Feliciano do cargo sob pena da Presidência da República, do Congresso Nacional, do PSC e da Igreja do Reino de Deus ficar comprometidas a incitação à violência, a homofobia e o racismo. Nos púlpitos de suas igrejas de (todas as naturezas) que cada pastor, padre ou fiel defenda o que quiser sem que ninguém os impeça dentro dos limites legais de exercer suas crenças. Mas o Brasil é um país laico e mesmo o saudoso doutor Ulisses Guimarães tendo afirmado que ali “não é uma congregação de Filhas de Maria” e que “A política é a religião do diabo”, o Congresso Nacional não é uma igreja.
Este espaço é permanentemente aberto ao democrático direito de resposta a todas as pessoas e instituições aqui citadas.