quinta-feira, 25 de julho de 2013

O QUE INSTITUIÇÕES E PESSOAS FAZEM PARA SE MANTEREM NO PODER

Publicado em 25/07/2013
Agentes da PM e da ABIN 
estavam infiltrados nas manifestações

Começam a aparecer provas da participação de agentes dos órgãos de segurança do Estado nas manifestações promovendo agitação e quebra-quebra

O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, disse, na manhã desta quinta-feira (25), que não sabia que havia policiais infiltrados nas manifestações realizadas no Rio. Segundo ele, são detalhes técnicos que ficam a cargo da equipe de segurança.
Vídeos e relatos publicados nas redes sociais acusam a PM de ter infiltrado policiais sem farda em um protesto na noite de segunda-feira (22) no Rio para provocar tumulto.

O relações-públicas da Polícia Militar, coronel Frederico Caldas, se disse "enojado" com a acusação e afirmou que considera um absurdo imaginar que um policial possa agredir um colega.

O tumulto ocorreu depois de uma passeata que começou pacífica e ia até a sede do Governo do Rio de Janeiro, onde o Papa Francisco recebeu as boas-vindas. Um confronto deixou cinco manifestantes e dois policiais militares feridos - um deles por um coquetel molotov. Todos os feridos já receberam alta e passam bem.

E a Polícia Militar foi criticada por ter prendido um integrante do Mídia Ninja, um grupo que transmite as manifestações pela internet.

Por volta das 17h de segunda, os manifestantes começaram a se reunir na praça do Largo do Machado, na Zona Sul do Rio. O bairro é vizinho a Laranjeiras, onde fica o Palácio Guanabara, sede do governo do estado.
Entre as cerca de 300 pessoas, com faixas e cartazes, havia integrantes de partidos políticos e de movimentos de lésbicas, gays, bissexuais e transsexuais. O grupo ocupou as escadarias de uma igreja onde peregrinos cantavam músicas católicas. E promoveu um beijaço contra a homofobia.

Pouco depois das 18h, os manifestantes saíram em caminhada, em direção ao Palácio Guanabara, onde autoridades davam as boas-vindas ao Papa Francisco. No caminho, mais pessoas se juntaram à passeata, que chegou a reunir 1.500 participantes, segundo a Polícia Militar.

Em frente ao bloqueio montado pela PM, a cerca de 200 m da sede do governo, manifestantes queimaram um boneco, que representava o governador Sergio Cabral. O grupo permaneceu no local, sem que houvesse confronto, por cerca de meia hora, até a chegada de pessoas mascaradas e vestidas de preto. Houve gritos contra a PM: "Sem hipocrisia, a polícia mata pobre todo dia!".

Depois que o papa Francisco deixou o Palácio Guanabara, as grades que bloquevam a rua foram derrubadas. Não é possível identificar por quem.

Começou uma batalha: de um lado, pedras; do outro, balas de borracha. Os mascarados lançaram conquetéis molotov contra os policiais. Um PM foi atingido pelo fogo e se jogou no chão, na tentativa de apagar as chamas. A polícia reagiu com bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo, balas de borracha e jatos d'água.
Houve correria e a confusão se espalhou por outras ruas. 

Numa delas, os PMs encontraram uma mochila com várias garrafas de coquetel molotov. "É isso que vocês têm que filmar", diz o PM. Uma pessoa pergunta: "Isso é o quê, guerreiro?". E o policial reponde: "Coquetel molotov. Isso aqui mata um policial".

Muitos policiais estavam sem idenficação nas fardas. Uma manifestante aborda um deles. Ela pede para que o PM se identifique, mas ele se nega.
Segundo a Polícia Militar, um menor foi apreendido e sete pessoas foram detidas por desacato, incitação à violência, formação de quadrilha, exposição ao perigo, resistência e dano qualificado.

Depois das prisões, um grupo de 300 pessoas se concentrou em frente ao prédio da delegacia do Catete, pedindo a libertação dos detidos. Foi o início novas confusões. Carros da tropa de choque foram cercados. Policiais tentaram liberar a pista e houve um empurra-empurra. PMs usam spray de pimenta e o grupo se dispersa pelas ruas do bairro. 

No tumulto, comerciantes foram obrigados a fechar as portas.
Seis detidos foram liberados porque teriam praticado crimes de menor potencial ofensivo. Entre eles estava Filipe Peçanha, conhecido como Carioca. Ele é integrante da Mídia Ninja, grupo que tem se dedicado a transmitir as manifestações, ao vivo, pela internet. Filipe conversou com um repórter da “GloboNews” e disse que não sabia por que tinha sido detido. "Me trouxeram aqui para fazer uma averiguação, eu fiquei aqui esperando, fui bem tratado pela Polícia Civil, mas a Polícia Militar me colocou à força, sem nenhum tipo de justificativa. Sem nenhum tipo de alegação."

Na terça, nas redes sociais, pessoas que acompanhavam a manifestação acusaram a PM de ter infiltrado policiais sem farda no protesto para provocar o tumulto. Foram postados vídeos em que, após o tumulto, dois homens correm em direção à barreira da polícia. Um deles tira a camisa. Eles parecem se identificar e são autorizados a passar.

Por telefone, o coronel Frederico Caldas reconheceu que policiais do serviço reservado, a paisana, acompanham a manifestação, com o objetivo de identificar agressores e coletar provas, mas disse que não é possível afirmar que os homens mostrados nos vídeos sejam policiais.

Agente da Abin e mulher são presos participando de quebra-quebra
Presos pela Polícia Militar sem documentos na madrugada de 18 de julho no Leblon, palco de uma das mais violentas manifestações do Rio, perto da residência do governador Sérgio Cabral, o casal de geógrafos Igor Pouchain Matela e Carla Hirt foram levados à 14ª DP, no bairro. Carla foi detida no momento em que supostamente atirava pedras na vidraça de uma loja, e Igor, por ter desacatado os PMs que a prenderam.

O caso seria mais um dos que marcam os bastidores dos protestos na cidade, não fosse por um detalhe: segundo os policiais de plantão naquele dia, os dois se apresentaram como agentes da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e agora são tratados como suspeitos de estarem ali trabalhando infiltrados. A Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo (CEIV) e a Polícia Civil estão investigando o caso.

A Polícia Civil confirmou ao GLOBO que Igor e Carla se apresentaram como agentes da Abin ao chegarem à delegacia. Também informou que, de acordo com o relato do delegado titular da 14ª DP, Rodolfo Waldeck, Carla foi presa em flagrante por formação de quadrilha, e Igor, por desacato a um PM.

Na delegacia, Igor também teria desacatado a delegada Flávia Monteiro, responsável pelo plantão no dia. Carla foi autuada por formação de quadrilha e liberada após pagamento de fiança. Igor, por crime de desacato. Os dois não foram localizados para comentar a denúncia.

Segundo nota da Polícia Civil, a CEIV ,criada depois dos atos de vandalismo durante os protestos , vai “investigar a informação de que o casal preso na manifestação do dia 18 de julho no Leblon seria integrante da Abin”.
Agência nega ter agentes infiltrados

A Abin negou manter agentes infiltrados nas manifestações do Rio. Em nota, garantiu “desconhecer a prisão ou a autuação de servidor de seu quadro em 18 de julho ou nos dias subsequentes na cidade do Rio” e explicou que “o sigilo dos nomes dos integrantes da Abin é garantido pela lei 9.883, de dezembro de 1999, sendo, portanto, vedada a sua publicação, inclusive em atos oficiais”.

No Diário Oficial da União, de 2008, Igor aparece entre os nomeados para atuar junto ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, ao qual a Abin está subordinada.

O caso de Igor e Carla acontece num momento delicado, em que vem à tona a participação de policiais fluminenses infiltrados em manifestações. Esta semana, o Ministério Público estadual anunciou que passou a investigar vídeos divulgados nas redes sociais, em que policiais do serviço reservado (P-2) da PM do Rio aparecem supostamente infiltrados no protesto em Laranjeiras, na noite de segunda-feira, durante a recepção ao Papa Francisco. No mesmo dia, a PM reconheceu o uso do expediente, informando que os policiais agem filmando, coletando provas e fazendo prisões.

Infiltrar agentes é prática reconhecida internacionalmente nos meios policiais de inteligência, mas os especialistas alertam que há limites: o agente infiltrado deve se limitar a observar, coletar informações e transmiti-las. Mas eles não podem se envolver em crimes — há denúncias de manifestantes de que PMs estariam incitando e até praticando atos violentos.

“Na ausência de disciplina legal específica, os limites da ação de inteligência são os parâmetros gerais, constitucionais e legais dos agentes estatais — disse um especialista, que preferiu o anonimato”.
Ainda segundo ele, essa premissa tem sua validade confirmada na Lei n. 9.034/95, que trata dos meios operacionais para a prevenção e repressão de ações praticadas por organizações criminosas. Em seu art. 2, inciso V, a lei prevê a infiltração por agentes de polícia ou de inteligência, em tarefas de investigação, constituídas pelos órgãos especializados pertinentes, mediante circunstanciada autorização judicial.

“Falando em tese eu diria: mesmo para a infiltração estrutural, é preciso autorização judicial que preveja os limites genéricos da operação. Na lei atual, embora não esteja prevista a possibilidade da prática de crimes pelos agentes infiltrados, entende-se na doutrina ser admissível quando se tratar de prática necessária e imprescindível para a garantia da infiltração, o que envolve obter a confiança do grupo, e o crime a praticar for menor do que o investigado”.