25 de novembro de 2013
O Brasil na banguela
O Brasil na banguela
CARLOS
ALBERTO DI FRANCO - O
Estado de S.Paulo
Armação da imprensa.
Distorção da mídia. Patrulhamento de jornalista. Quantas vezes, caro leitor,
você registrou essa reação nas páginas dos jornais? Inúmeras, estou certo. Elas
estão contidas, frequentemente, em declarações de homens públicos apanhados com
a boca na botija, no constrangimento de políticos obsessivamente preocupados
com a própria imagem e no destempero de lideranças que pescam nas águas turvas
do radicalismo. Todos, independentemente de seu colorido ideológico, procuram
um bode expiatório para justificar seus deslizes e malfeitos. A culpa é da
imprensa! É preciso partir para o controle social da mídia, eufemismo esgrimido
pelos que, no fundo, defendem a censura às empresas de conteúdo independentes.
Sou otimista. Acho que o
Brasil é maior que seus problemas. Mas não sou cego. O Brasil está na banguela.
Corrupção crescente, educação detonada e gestão pública incompetente, não
obstante as lantejoulas do marketing político, começam a apresentar sua
inescapável fatura. E a sociedade está acordando. As ruas, em junho deste ano,
deram os primeiros recados. A violência black bloc, um desvio condenável e
inaceitável dos protestos, precisa ser lida num contexto mais profundo. Há um
cansaço do Estado ineficiente, corrupto e cínico. E a coisa não se resolve com
discursos na TV, mas com mudanças efetivas.
Corrupção endêmica e
percepção social da impunidade compõem o ambiente propício para a instalação de
um quadro de desencanto cívico. Alguns, equivocadamente, vislumbram uma relação
de causa e efeito entre corrupção e democracia. Outros, perigosamente
desmemoriados, têm saudade de um passado autoritário de triste memória. Ambos,
reféns do desalento, sinalizam um risco que não deve ser subestimado: a utopia
autoritária.
O Brasil tem
instituições razoavelmente sólidas, embora parcela significativa da sociedade
já comece a questionar a validade de um dos pilares da democracia: o Congresso
Nacional. O descrédito generalizado, sobretudo dos parlamentares, captado em
inúmeras pesquisas de opinião, é preocupante.
O fisiologismo político
é responsável por alianças que são monumentos erguidos à incoerência e ao
cinismo. Quando vemos Lula, Dilma, Sarney, Collor e Maluf, só para citar
exemplos mais vistosos, no mesmo barco, paira no ar a pergunta óbvia: o que une
firmemente aqueles que estiveram em campos tão opostos? Interesse. Só
interesse. Os fisiologistas têm carta-branca para gozar as benesses do poder.
Os ideológicos, lenientes e tolerantes com o apetite dos fisiológicos, recebem
deles o passaporte parlamentar para avançar no seu projeto autoritário.
A arquitetura
democrática de fachada recebe a certidão do "habite-se" na força cega
dos currais eleitorais. Para um projeto autoritário o que menos interessa é
gente educada, gente que pense. Educação de qualidade, nem falemos.
O sistema
educacional brasileiro é um desastre. Multiplicam-se universidades, mas não se
formam cidadãos: homens e mulheres livres, bem formados, capazes de desenvolver
seu próprio pensamento, conscientes de seus direitos e de seus deveres.
Há, sim,
um apagão do espírito crítico. Desaba o Brasil no declive de uma unanimidade
que, como dizia Nelson Rodrigues, é sempre perigosamente burra.
Nós, jornalistas, precisamos trazer os candidatos para o terreno das verdadeiras discussões. É preciso saber o que farão, não com chavões ou com o brilho do marketing político, mas com propostas concretas em três campos: educação, infraestrutura e ética.
Nós, jornalistas, precisamos trazer os candidatos para o terreno das verdadeiras discussões. É preciso saber o que farão, não com chavões ou com o brilho do marketing político, mas com propostas concretas em três campos: educação, infraestrutura e ética.
A competitividade global reclama crescentemente gente
bem formada. Quando comparamos a revolução educacional sul-coreana com a
desqualificação da nossa educação, dá vontade de chorar. Como lembrou recente
editorial do jornal O Estado de S. Paulo, se
"ainda faltasse alguma prova da crise educacional brasileira, o novo
relatório da Confederação Nacional da Indústria (CNI) sobre a escassez de
pessoal para a construção seria mais que suficiente". A assustadora falta
de mão de obra com formação mínima é um gritante atestado do descalabro da
educação brasileira.
Governos,
independentemente de seu colorido partidário, sempre exibem números chamativos.
E daí? Educação não é prédio. Muito menos galpão. É muito mais. É projeto
pedagógico. É exigência. É liberdade. É humanismo. É aposta na formação do
cidadão integral. O Brasil pode morrer na praia. Só a educação de qualidade será
capaz de preparar o Brasil para o grande salto. Deixarmos de ser um país
fundamentalmente exportador de commodities para entrar, efetivamente, no campo
da produção de bens industrializados.
Para isso, no entanto, é
preciso menos discurso sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e
mais investimento real em infraestrutura. É preciso fazer reportagem. Ir ver o
que existe e o que não existe. O que foi feito e o que é só publicidade. Ver e
contar. É o nosso papel. É a nossa missão. Nós, jornalistas, sucumbimos com
frequência ao declaratório. Registramos, com destaque, a euforia presidencial
com o futuro do pré-sal. Mas como andam os projetos reais que separam a
propaganda da realidade? É por aí que devemos ir.
Tudo isso, no entanto,
reclama o corolário da ética. Rouba-se muito. Muito dinheiro público desaparece
no ralo da impunidade. Queixa-se a sociedade da impunidade radical. Seis anos
após aceitar a denúncia do mensalão, o Supremo Tribunal Federal determinou a
prisão dos principais condenados no esquema de corrupção do governo Lula.
Trata-se de uma decisão histórica e de um claro divisor de águas.
Educação, infraestrutura
e ética podem mudar o destino do Brasil.
DOUTOR EM COMUNICAÇÃO PELA UNIVERSIDADE DE NAVARRA, É
DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO DO INSTITUTO INTERNACIONAL DE CIÊNCIAS
SOCIAIS
E-MAIL: DIFRANCO@IICS.ORG.BR