247 – "O fato de as pessoas não saberem como fiscalizar o
processo eletrônico não é sinônimo de segurança, ao contrário, é uma situação
de incerteza".
A discussão é colocada pelo sociólogo Sergio Amadeu da Silveira, da
Universidade Federal do ABC (UFABC). Ele defende que essa situação
"precisa definitivamente mudar".
Segundo Amadeu, a lisura do resultado das eleições está nas mãos de
empresas privadas terceirizadas, que são contratadas pelo TSE e pelos TREs para
cuidar do processo eleitoral e, portanto têm acesso às urnas eletrônicas. Leia
abaixo seu artigo sobre o assunto:
LISURA DAS ELEIÇÕES ESTÁ NAS MÃOS DE EMPRESAS
PRIVADAS
E se as pesquisas do dia anterior ao
primeiro turno e a própria pesquisa de boca de urna não estivessem erradas?
Chamou a atenção as disparidades entre as
pesquisas e os resultados eleitorais.
Essa dúvida não poderia existir.
Muitos pesquisadores têm questionado a
opacidade e as inúmeras incertezas do processo eleitoral brasileiro chamado
simplificadamente de "urna eletrônica".
O fato das pessoas não saberem como
fiscalizar o processo eletrônico não é sinônimo de segurança, ao contrário, é
uma situação de incerteza. Como a democracia depende de legitimidade, resolvi
escrever esta breve consideração sobre a votação brasileira.
Vou direto ao ponto.
Quem poderia fraudar a vontade popular e
alterar os resultados coletados nas urnas eletrônicas? Respondo com clareza:
aqueles que têm acesso a elas. Quem tem acesso às urnas?
As empresas terceirizadas pelo TSE e
pelos TREs para cuidar do processo eleitoral.
Como poderia ocorrer uma fraude?
Por exemplo, na urna eletrônica?
Vamos ver como a Justiça eleitoral define
a urna utilizada:
"A urna eletrônica é um
microcomputador de uso específico para eleições, com as seguintes
características: resistente, de pequenas dimensões, leve, com autonomia de
energia e com recursos de segurança".
Como qualquer computador, para ele
funcionar depende de um programa, ou seja, de um software. Se os softwares não
foram auditados, eles podem conter rotinas que, quando acionadas, alteram o
resultado da votação.
O eleitor confirma o seu voto e depois
ele poderia ser modificado no resultado geral da urna. Como não há a impressão
simultânea do voto em papel, em caso de suspeita ou dúvida, não é possível
fazer uma recontagem para saber se o que o eleitor votou é o que foi computado
na urna.
Como não temos a impressão simultânea, é
possível saber se alguém inseriu alguma rotina maliciosa nas urnas de uma zona
eleitoral? Antes de inserir os softwares nas urnas eles deveriam ser auditados.
Eles foram? As informações que tenho é que apenas o PDT participou de auditoria
do processo de lacração das urnas, mas não analisou todos os softwares que
foram nelas embarcados.
A fraude só pode ocorrer alterando o
programa das urnas?
Não.
Pode acontecer também na transmissão de
dados para a central de totalização de votos. Pode ocorrer na manipulação dos
pen drives que contêm alguns resultados e em outras fases do processo. Enfim,
existem diversos pontos importantes de checagem e de controle.
Repare que o governo federal não têm
acesso as urnas.
Quem tem acesso é o Poder Judiciário.
Na verdade, os juízes e funcionários
públicos da Justiça Eleitoral não são técnicos em informática e em segurança da
informação. Por isso, quem cuida das urnas, do software, da transmissão de
dados são empresas terceirizadas que foram contratadas pelo TSE e pelos TREs.
Desse modo, hoje, a democracia brasileira
e a lisura do pleito estão nas mãos de empresas como a Modulo Security, Engetec
e outras.
Esperamos que todos os cuidados sejam
tomados por elas. Mas temos que ficar vigilantes e desconfiados. Acho que todos
os técnicos que trabalham neste processo deveriam ter seus nomes publicados e,
assim como os funcionários públicos de determinados cargos, ter suas
declarações de renda enviadas, antes e um ano depois do pleito. Os donos dessas
empresas deveriam ser conhecidos, pois deles dependem a garantia da vontade
popular.
Podemos fiscalizar essas empresas até
domingo?
Não.
Mas estamos atentos.
Vamos deixar bem claro que sabemos que
eles são os responsáveis pelo processo. Vamos também ficar de olho no
"inserator", rotina encontrada na urna e que permite inserir scripts
que poderiam ser validados pela criptografia do sistema, conforme alertado pela
Petição TSE Nº 23.891.
Essa situação de incerteza e opacidade
precisa definitivamente mudar. Por isso, quando acabar essas eleições
precisamos realizar um amplo processo de debate público sobre o processo
eleitoral.
Não podemos depender da "bondade e
ética" de empresas. Precisamos de controles e transparência do processo
para toda a sociedade.
Sérgio Amadeu da Silveira é sociólogo e
professor da Universidade Federal do ABC (UFABC).