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247
10
DE FEVEREIRO DE 2015
PML:
“MARCO AURÉLIO
MOSTROU QUE
O REI ESTÁ NU”
Ministro do STF "apontou o dedo para uma
situação que muitos enxergam, mas por interesse político, covardia ou conforto
pessoal, preferem fingir que não estão vendo — os abusos da Operação Lava Jato
contra as regras do Estado Democrático de Direito", escreve Paulo Moreira
Leite, diretor do 247 em Brasília; jornalista lembra do Caso Dreyfus:
"Imagine que o mais conhecido erro judiciário da história universal,
envolvendo um oficial do Exército francês colocado a ferros sob o sol
inclemente da Guiana sob a falsa acusação de vender segredos militares para o
Exército alemão, só pode ser desmascarado graças a uma atitude
semelhante"; e conclui que "nossa sociedade do espetáculo não precisa
de heróis nem de justiceiros. Mas necessita de autoridades que tenham a coragem
de cumprir seus deveres"
247 – Ao dar sua opinião sobre
a Operação Lava Jato, comandada pelo juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara
Civil de Curitiba (PR), o ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio
Mello "mostrou que o rei está nu", avalia Paulo Moreira Leite,
diretor do 247 em Brasília.
O magistrado, diz ele,
"apontou o dedo para uma situação que muitos enxergam, mas por interesse
político, covardia ou conforto pessoal, preferem fingir que não estão vendo —
os abusos da Operação Lava Jato contra as regras do Estado Democrático de
Direito".
A crítica de Marco Aurélio se referia ao mandado de condução
coercitiva contra o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, que não havia se
recusado a prestar depoimento sobre o caso, mas que acabou sendo alvo de um
"espetáculo".
"A TV mostrou
imagens grotescas de policiais pulando o muro da casa de Vaccari, cena
destinada a criar um espetáculo vergonhoso de faroeste para os
telejornais", descreve PML, que opina em seguida:
"A finalidade
destas cenas nós sabemos: ajudam a criminalizar os acusados, permitem que sejam
vistos como cidadãos condenáveis, capazes de atos criminosos — sem um fiapo de
prova. Essa é a função do espetáculo".
O colunista lembra, em
artigo em seu blog no 247, do Caso Dreyfus. "Imagine que o mais conhecido
erro judiciário da história universal, envolvendo um oficial do Exército
francês colocado a ferros sob o sol inclemente da Guiana sob a falsa acusação
de vender segredos militares para o Exército alemão, só pode ser desmascarado
graças a uma atitude semelhante".
E conclui que "o
que se aprende, aqui, é uma lição bastante simples. Nossa sociedade do
espetáculo não precisa de heróis nem de justiceiros.
Mas necessita de
autoridades que tenham a coragem de cumprir seus deveres, como guardiões das
verdades duras e os direitos de pedra que estão na Constituição
Íntegra de seu texto:
MARCO AURÉLIO
E A QUESTÃO
DE CARÁTER
Reação
de ministro do STF aos abusos da Lava Jato
lembra
que não basta erudição nem amigos influentes
para
se fazer um bom juiz. É preciso coragem
O ministro Marco
Aurélio Mello deu uma aula de Justiça no fim de semana. Não. Ele não fez
nenhuma ginástica erudita nem anunciou uma nova jurisprudência que o cidadão
comum não entende.
Conhecido pelo
espírito bem-humorado, também não fez ironias.
Marco Aurélio mostrou que o Rei está nu: apontou o dedo
para uma situação que muitos enxergam mas, por interesse político, covardia ou
conforto pessoal, preferem fingir que não está vendo — os abusos da Operação
Lava Jato contra as regras do Estado Democrático de Direito.
“Com 25 anos de
Supremo, eu nunca tinha visto nada parecido. E as normas continuam as mesmas”,
disse.
O ministro se referia a “condução coercitiva” de João
Vaccari Neto, responsável pelas finanças do Partido dos Trabalhadores, para
prestar um depoimento a Polícia Federal — quando a boa regra democrática
determina que cidadão em sua condição tenham a oportunidade de comparecer,
voluntariamente, perante autoridades policiais, para prestar esclarecimentos
necessários.
Você lembra do
espetáculo produzido: a TV mostrou imagens grotescas de policiais pulando o
muro da casa de Vaccari, cena destinada a criar um espetáculo vergonhoso de
faroeste para os telejornais.
A finalidade destas cenas nós sabemos: ajudam a
criminalizar os acusados, permitem que sejam vistos como cidadãos condenáveis,
capazes de atos criminosos — sem um fiapo de prova. Essa é a função do
espetáculo.
Marco Aurélio deu uma demonstração semelhante de caráter em
2012, durante o julgamento da AP 470. Inconformado diante das seguidas
demonstrações de agressividade de Joaquim Barbosa, que tinham a função de
intimidar os colegas de plenário, ele rebateu:
“Não admito que
Vossa Excelência suponha que todos aqui sejam salafrários e só Vossa Excelência
seja vestal.”
O jogo era o
mesmo: ao ficar em silêncio diante do “espetáculo a flor da pele, intolerância
e desqualificação dos colegas”, como descreveu o Estado de S. Paulo em
editorial, os ministros ajudavam a montar o teatro destinado a justificar
medidas extremas, “exemplares”, como se dizia, típicas daqueles tristes
momentos em que a Justiça se assemelha a uma noite no circo.
Imagine que o
mais conhecido erro judiciário da história universal, o Caso Dreyfus,
envolvendo um oficial do Exército francês colocado a ferros sob o sol
inclemente da Guiana sob a falsa acusação de vender segredos militares para o
Exército alemão, só pode ser desmascarado graças a uma atitude semelhante.
O coronel George
Picquart, que havia sido professor de Alfred Dreyfus no Colégio Militar,
teve acesso aos arquivos do serviço secreto que demonstravam que as provas
contra o capitão eram pura falsificação, destinadas a esconder o verdadeiro
traidor.
A partir daí,
Picquart passou a travar uma luta para rever o caso, enfrentando as reações que
se pode imaginar. Foi desterrado para a Tunisia, no Norte da África, e também
foi processado. Quando o segundo julgamento de Dreyfus estava em curso,
Picquart aguardava sua chance num tribunal militar.
O que se aprende,
aqui, é uma lição bastante simples. Nossa sociedade do espetáculo não
precisa de heróis nem de justiceiros. Mas necessita de autoridades que tenham a
coragem de cumprir seus deveres, como guardiões das verdades duras e os
direitos de pedra que estão na Constituição — mas precisam ser garantidos, dia
após dia, por homens e mulheres de carne-e-osso. Sem eles, o Estado de
Democrático de Direito é um enfeite pendurado na parede.
Essa é a lição.