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13 DE MARÇO DE 2015
MINISTÉRIO PÚBLICO:
VERDADE DOGMÁTICA
VERSUS VERDADE FACTUAL
É
passada a hora de refutar-se a ideia presunçosa e arrogante de que o Brasil
precisa de “homens-santos”, porque os demais são infectos. O país precisa é de
razoabilidade, de interpretação da lei com base no bom senso
Diante de especulações que sugerem que, em
resposta às investigações de políticos na Operação Lava Jato, o Congresso se
mobiliza para instalar uma CPI contra o Ministério Público, com o fito de
apurar suposto vazamento na lista de investigados apresentada ao STF, na semana
passada, há de se ponderar sobre algumas questões.
Inicialmente, mesmo não se sabendo se essa estratégia existe, e,
em existindo, se irá vingar, o que parece razoável supor é que, havendo-se uma
iniciativa, ainda que por mera retaliação, de resgatar-se a PEC 37,
dificilmente haverá uma nova rejeição.
Em 2013, recorde-se, a aprovação bateu na trave. Tardassem mais
uma semana os protestos de junho e o texto seria aprovado sem maiores
dificuldades.
Até mesmo porque no Congresso havia uma maioria relativamente bem
consolidada, convencida de que as atividades investigativas do Ministério
Público estavam frequentemente conflitando com as atribuições constitucionais
próprias da polícia judiciária, de modo que deveriam ser centralizadas nesta
última.
Vieram, porém, as manifestações, e, com elas, um grito coletivo
contra a PEC 37, forçando o recuo parlamentar. Apesar disso, poucos hão de
crer, atualmente, que aquele público que outrora saíra às ruas contra o suposto
atentado ao Ministério Público, lembra-se do conteúdo da PEC ou sequer
recorde-se dela.
É que a canalização da rebeldia para a rejeição da Emenda não
passou de uma estratégia de manipulação de massas, milimetricamente calculada
pela mídia, com o único objetivo de centrar a atenção dos autoproclamados
"indignados" num tema, desviando-a do eixo realmente caro à
discussão, a Reforma Política.
Junto a isso, muito claro também a tentativa de
desgastar o governo, um ano antes das eleições presidenciais.
Mas será que há alguém disposto a ir novamente às ruas pra centrar
sua discussão numa bandeira que, definitivamente, não é a mais importante - o
Ministério Público - para deixar de protestar pela imprescindível Reforma
Política? Provavelmente, duas vezes, não.
Primeiro, porque já se sabe que o que importa para o futuro do
país, verdadeiramente, é a Reforma Política.
Combater-se à corrupção sem se
fazer a reforma política é enxugar-se gelo atrás de gelo. Outra razão é, de
fato, a evidência de um incômodo com a usual postura de “xerifão” de certos
membros do Ministério Público (Judiciário idem, em escala menor), pessoas que
por um lado se acham com o direito de supor que todo mundo é delinquente, mas
que, por outro, se põem acima de qualquer suspeita, tal qual divindades acima
dos mortais.
A dura realidade é que dificilmente há alguém que faça política
atualmente no Brasil, que ordene despesas, e não sofra com algum tipo apreensão
pela possibilidade de, um dia, ser surpreendido com uma ordem judicial de
prisão.
Por mais séria que seja a pessoa, até que ela comprove a inocência, sua
honra já foi para o espaço. Quem há de querer um trauma desses para si e para a
família?
Lamentavelmente é esse o caminho que está sendo ladrilhado pelos
que se deleitam com a onda de criminalização da política, em curso no país.
Quisera tivessem ao menos a consciência do quanto isso afasta do trato com a
coisa pública, por puro temor, brasileiras e brasileiros que bem poderiam estar
dando sua contribuição à nação.
Ora, se a ideia é institucionalizar a judicialização da política
no país, o objetivo parece ser esse, que venham à mente as lições de Hannah
Arendt para assimilação mais adequada de conceitos como política e verdade
factual, e de suas interações com o Direito dogmático e a Justiça.
É que política não se prescreve, tampouco se realiza baseada em
códigos, normas petrificadas.
Política é uma coisa, e Direito, dogmaticamente
pensado, é outra, de modo que não é estranho que a verdade factual da política
se distinga da verdade jurídico-dogmática.
Trata-se de uma assertiva espantosa, porém, o fato é que quem é
legitimada, periodicamente, pelo povo, através do voto, é a verdade
político-factual, e não a verdade dogmático-jurídica.
Pela ótica invertida, o
político, por ser um cidadão de múnus social diferenciado, carrega consigo um
bônus e um ônus: o bônus é poder expressar-se com garantia de imunidade, mas o
ônus é a necessidade de submeter-se a um julgamento popular, direto e
universal, a cada processo eleitoral.
Não se pode desconsiderar, e muito menos
desprezar, a importância e o peso que esse fato tem para a democracia,
sobretudo num Estado que se diz democrático de Direito, como é o caso do
Brasil.
Pois bem! Se os “senhores da lei”, que não obstante bem letrados,
não foram preparados nem legitimados para a política, querem agora balizar a verdade
factual dela decorrente, que pelo menos reconheçam que diante de conjunturas de
processos políticos, institutos jurídicos como culpa e dolo, erro e fraude,
equívoco e má-fé, absorvem conotações em gradações diferentes dos conteúdos
estritamente dogmáticos impingidos pela lei, não raramente cega aos fatos
sociais e descompassada ao timing das circunstâncias.
É passada a hora de refutar-se a ideia presunçosa e arrogante de
que o Brasil precisa de “homens-santos”, porque os demais são infectos.
O
país precisa é de razoabilidade, de interpretação da lei com base no bom senso,
desde a investigação, durante o curso do processo, na condenação, até no final
cumprimento da pena. É assim que se faz justiça.
Por que há de se atribuir, prima
facie, mais crédito a um depoimento obtido por delação premiada do
que à palavra de alguém que sequer foi formalmente acusado?
Será que não se
percebe que aceitar um fato desses significa consentir-se automaticamente com o
absurdo de suprimir-se um princípio constitucional tão relevante como a
presunção de inocência, ante a palavra de alguém já induvidosamente criminoso?
É preciso acabar-se de vez com a hipocrisia de se sustentar que
agir razoavelmente é compactuar com a impunidade, que a força é mais eficiente
que o devido processo legal, que a razão de alguns iluminados é mais apurada
que a razão do povo, expressada pelo voto.
Afinal de contas, o Brasil é uma
democracia ou é uma aristocracia ministerial-judiciária?
O que se quer
alcançar, justiça no caso concreto ou justiçamento pelas imperfeições da
política, imperfeições cujas origens estão na forma estrutural do Estado
brasileiro, muito além, portanto, de um processo judicial?
Mas qual será a solução para essa problemática, resgatar a PEC 37?
Não, não se a razão for pura retaliação. Eliminar o Ministério Público ou
suprimir suas prerrogativas constitucionais? Muito menos.
Ninguém há de duvidar
da importância do MP para a República, tampouco questionar a relevância do
Judiciário para o funcionamento do Estado.
Urge, de outro lado, seja dado ponto final às tentativas
midiáticas de rotular, com a pecha da criminalização, as instituições do país.
Imensos grupos econômicos, verdadeiros cartéis da comunicação, estão por trás
dessas investidas, com propósito de ampliar suas redes de cooptação e
fortalecer seus já vultosos e lucrativos empreendimentos.
Do ponto de vista jurídico, a solução para o dilema é simples.
Investigue-se quem tiver que investigar, mas sem invadir a vida de quem, de
fato, não merece ter a vida vasculhada.
Não se publicite acusações sobre alguém
que sequer teve o direito de conhecer o teor daquilo que terá prerrogativa
legal de contestar. Não se repute a ninguém a mácula de criminoso, antes de uma
sentença condenatória decorrente de um processo justo.
Do ponto de vista político é que se deve fazer um exercício
relativamente maior. Sem precisar conflitar-se com competências de Poderes e de
instituições, que se busque, incisiva e ostensivamente, uma Reforma Política,
pois é no sistema eleitoral do país, sobretudo no que tange ao financiamento
empresarial das campanhas eleitorais, onde reinam as contradições que superpõem
de um lado, a boa política; do outro, a politica nefasta.
Para isso, há de se reconhecer que alternativa não há, senão
apoiar a convocação de um plebiscito autorizativo da instalação de uma
Assembleia Nacional Constituinte específica, com competência de deliberação
única e exclusiva sobre Reforma Política.
Dada à conjura nacional, ou será assim, ou não será de nenhum
jeito. Argumentar contrariamente, seja com sofismas jurídicos ou com
reverberações ideológicas, é pura hipocrisia de quem não pensa no Brasil, de
quem sente felicidade na decomposição moral e jurídica do país, de quem torce
pelo subdesenvolvimento e pela eterna submissão desse gigante latino-americano
às economias do hemisfério norte e ao mercado financeiro internacional.
E tão imperiosa quanto à Reforma Política, é a regulamentação dos
limites de ação desses oligopólios privados de comunicação do país, mas isso é
assunto para outro texto.