FCO.LAMBERTO FONTES
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PAULO MOREIRA LEITE
O jornalista e escritor Paulo Moreira Leite, é diretor do 247 em
Brasília
19 de
Janeiro de 2016
Falando dos planos de trabalho da força-tarefa do
Ministério Publico encarregada da Lava Jato, um procurador ouvido pela
Folha de São Paulo (17/1/2015) empregou a seguinte imagem para se referir a
prisões e operações grandiosas que devem ocorrer daqui para a frente:
"Há bolas quicando e não podemos perder a
chance de chutar para o gol", disse.
Nós sabemos que os brasileiros são favoráveis a que se apure casos de
desvios de corrupção em todas as áreas, em particular numa empresa do porte da
Petrobras.
Num trabalho de décadas, está na cara que se construiu um
esquema de abusos e desvios com vida própria, qualquer que fosse o governo no
comando do Estado.
Mas é claro que a discussão sobre "bolas
quicando" não é esta.
Consiste em saber se é razoável utilizar as mazelas de uma empresa construída
com o sacrifício de sucessivas gerações de brasileiros desde sua criação, em
1952, a partir de métodos que prejudicam o país, reduzem o emprego e o
crescimento.
Esta é a bola quicando em 2016. Não custa lembrar, sempre:
consultores do próprio PSDB sustentam que a Lava Jato causou uma queda de
2 pontos no PIB (que caiu 3 pontos em 2015) e gerou uma queda de R$ 45 bilhões
na massa salarial.
Para além dos efeitos objetivos, cabe assinalar os resultados subjetivos: a
perda de confiança, indispensável para qualquer esforço para retomar
investimentos e inverter uma tendência negativa, que ameaça derrubar a
economia para um patamar ainda pior até o final do ano.
Qual é o gol, neste caso: recessão de 7%, para lembrar a
derrota para a Alemanha no Mineirão? Desemprego a 11.7%, para lembrar o último
ano de FHC no Planalto?
É uma perspectiva grave, quando se recorda que um dos Princípios
Fundamentais da Constituição de 1988 consiste, justamente, em "erradicar a
pobreza" e "combater a desigualdade regional e social".
Isso não quer dizer, obviamente, que deve-se tolerar práticas de corrupção
que corroem o regime democrático e reproduzem privilégios inaceitáveis
entre quem tem acesso -- e quem não tem -- a benefícios do Estado.
Mas quer dizer que não se pode aceitar iniciativas que
estimulem a miséria e a desigualdade porque isso vai contra um Princípio
Fundamental.
Ao se mobilizar para impedir os acordos de leniência, por exemplo, a
força-tarefa tenta punir, com o desemprego, milhões de brasileiros que não têm
nenhuma responsabilidade pelos desvios e desmandos cometidos pelos executivos
das empresas onde trabalham.
Essa é a perspectiva.
Tornar qualquer recuperação mais difícil e incerta pois a
prioridade é punir aqueles que se julga -- e nem sempre se prova -- corruptos.
Referindo-se a uma decisão recente da força-tarefa, a Folha informa ainda:
"iniciadas em 2009, as investigações devem durar ao menos mais três
anos graças ao 'estoque' acumulado de indícios de crimes que levarão a
'inúmeras operações'".
Vamos pensar um pouco.
Dentro de dois anos e onze meses a presidente Dilma
Rousseff terá deixado a presidência da República. O mesmo vale para os 27
governadores de Estado. Cassado ou não, dentro ou fora da cadeia, Eduardo
Cunha não será mais presidente da Câmara. Ricardo Lewandovski já terá deixado a
presidência do Supremo Tribunal Federal, para ser substituído por Carmen Lúcia,
a próxima na linha de sucessão -- que também terá encerrado seu período na
presidência do STF.
Eleitos ou reeleitos no final de 2016, depois de "ao
menos três anos" os prefeitos de 5000 municípios brasileiros estarão
na segunda metade de seus mandatos.
Na Procuradoria Geral da Republica, Rodrigo Janot também
terá cedido seu lugar. A maioria dos comandantes militares terá sido
substituída. Idem para as estatais, a começar pela Petrobras.
Enquanto isso a força tarefa prossegue em seu calendário próprio, como um poder
a parte, que manda investigar, intimida, constrange e paralisa, segue seu
curso, sem prestar contas a ninguém.
Vaza o que será provado e também o que não será provado.
Não importa.
Importa a tensão, a incerteza.
É uma situação de terror -- e não se deve ter medo de chamar as coisas pelo
nome.
Atuando à margem da clássica divisão de poderes --
executivo, legislativo, judiciário -- temos uma situação construída pela
guilhotina francesa de 1792, quando julgamentos sumários abriram caminho para a
restauração monárquica e o retorno da grande burguesia ao palácio.
Algo semelhante com a Mãos Limpas italiana, que promoveu uma
limpeza ética no regime político daquele país que consagrou bunga-bunga Sylvio
Berlusconi?
Para entender o Brasil de 2016, pegue-se o triste destino do banqueiro André
Esteves, do BTG.
Passou quinze dias numa cela infecta de Bangu.
Libertado sem que se comprovasse uma única denúncia de
corrupção, voltou para casa R$ 15 bilhões mais pobre.
(Somando-se aquilo que se diz e se prova, e também o que se
diz e não se prova, estamos falando de uma soma jamais alcançada, mas nem de
muito longe, pelos escândalos da Petrobras.)
A operação contra André Esteves atingiu os fundos de investimentos do banco.
Especuladores e rentistas sofreram perdas amargas.
Num país com uma desigualdade histórica, em parte diminuída na última
década, é fácil alimentar um ressentimento difuso que se consola com a
injustiça contra um empresário endinheirado, como já perceberam diversos
jornalistas que aprenderam a usar argumentos "de esquerda" para
elogiar práticas que levam a governos de direita.
Nada de novo pelo menos desde "1984," romance em
que George Orwell denuncia a manipulação da linguagem e inversão deliberada de
conceitos políticos como forma de domínio social.
Hitler e Mussolini nunca deixaram de denunciar grandes
capitalistas quando era necessário.
Neste
universo, a Lava Jato seria aceitável porque um punhado de muito ricos foi
colocada atrás das grades.
O grave na verdade ocorreu no patamar de
baixo.
O BTG era o principal investidor privado nos
planos de moradia popular da prefeitura de São Paulo, a maior cidade
brasileira.
Quem perdeu com a prisão sem base real do banqueiro?
A população de baixa renda.
O operário que tinha uma chance de emprego nesse
mercado sinistro e escasso.
A família que estava na fila da casa própria.
Numa única lição aproveitável de um episódio monstruoso, a
prisão de um banqueiro bilionário ajudou a mostrar a importância universal dos
direitos individuais, lembrando de uma vez por todas que a parte mais fraca é
sempre a mais prejudicada quando essas garantias não são respeitadas.
Creio não haver imagem melhor para o Brasil de hoje.