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publicado 25/02/2016
por Grupo de Reflexão sobre
Relações Internacionais
Economia
A crise econômica mundial
e a quarta Revolução Industrial
Perspectivas para os
países em desenvolvimento deterioram-se
ainda mais diante das transformações
estruturais
em curso na economia mundial
O
início da Quarta Revolução Industrial foi extremamente debatido no Fórum
Econômico Mundial deste ano, em Davos, na Suíça.
Por Marcos
Antonio Macedo Cintra*
Sete anos após a crise financeira sistêmica,
desencadeada pela desvalorização dos ativossubprime, a economia
internacional persiste apresentando baixas taxas de crescimento, com elevada instabilidade financeira e tendência à deflação de
preços, das commodities e
bens industrializados, dado o excesso de oferta de produtos e de capacidade
ociosa instalada em diversos setores manufatureiros.
O FMI prevê para 2016 uma
expansão de 3,4% da economia mundial, de 2,1% dos países desenvolvidos e de
4,3% dos países em desenvolvimento.
As projeções reiteram que
desde 2012 a economia mundial vem apresentando baixo dinamismo concentrada nos
países em desenvolvimento, sem configurar motores capazes de sustentar um ciclo
de expansão com a duração e a profundidade ao que ocorreu entre 2003 e 2007,
quando cresceu a taxas superiores a 5%.
Além das dificuldades em se
retomar o crescimento sustentável nas economias desenvolvidas e a despeito de
políticas monetárias muito agressivas – afrouxamento monetário e taxas de juros
próximas de zero desde 2008–, as economias emergentes estão sendo empurradas
para o torvelinho da crise.
Os principais motivos são
contração da demanda puxada pela desaceleração da China,
queda nos preços das principais commodities,
elevada volatilidade dos mercados financeiros, desvalorização das moedas, fuga
de capitais desde a sinalização de alta da taxa de juros básica nos Estados
Unidos, contração do crédito.
Esse conjunto de fatores
arrasta parte significativa dos países em desenvolvimento para um período de
recessão ou de baixo dinamismo econômico.
Segundo documento divulgado
pelo Instituto de Finanças Internacionais, a fuga de capitais de 30 economias
emergentes alcançou US$ 735 bilhões em 2015, sendo liderada pela China.
Diante de um maior grau de
abertura da conta capital da economia chinesa, as incertezas sobre as
perspectivas de crescimento, sobre as bolsas de valores e sobre a
desvalorização da moeda desencadearam uma fuga de capitais da ordem de US$ 460
bilhões, a despeito de um superávit na balança comercial de US$ 595 bilhões.
Para 2016, as expectativas
apontam para uma fuga de capitais dos países emergentes de US$ 448
bilhões.
Outro indicador do aumento
da aversão ao risco das economias emergentes constitui a redução nas operações
de carry trade, nas quais
investidores captam recursos em países com taxas de juros mais baixas e aplicam
em papéis de países com retornos mais atrativos.
Como envolve investimentos
em ativos lastreados em moedas locais, o risco da operação corresponde a uma
valorização da divisa de financiamento em relação às que recebem essas
transações.
O índice UBS V24 Carry– que
mede os retornos das operações de carry
trade de uma cesta com 24
moedas – caiu 14,14% desde o pico recente, em agosto de 2014 (Castro, 2016):
Fonte: Bloomberg Intelligence
Neste cenário de elevada instabilidade
dos países emergentes, cresce o risco de uma desaceleração nos Estados Unidos,
na Europa e no Japão, desencadeada pelas perspectivas de alta das taxas de
juros americanas e de valorização do dólar.
Assim, a deterioração dos mercados
financeiros, os impactos da desaceleração na China, a queda do preço das commodities,
sobretudo do petróleo introduzem o risco de uma nova recessão global.
A Grande Recessão, como tem sido
denominada a dinâmica da economia mundial desde a crise financeira sistêmica de
setembro de 2008, deve se prolongar ainda mais.
Neste início de 2016, as perspectivas
para os países em desenvolvimento se deterioram ainda mais diante das
transformações estruturais em curso na economia mundial, o início da Quarta
Revolução Industrial, tema extremamente debatido no recente Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça.
Para Schwab (2015), a Quarta Revolução
Industrial promove uma “fusão de tecnologias, borrando as linhas divisórias
entre as esferas físicas, digitais e biológicas”.
Ela fomenta a inteligência artificial,
a robótica, a impressão 3D, os drones, a nanotecnologia, a biotecnologia,
a estocagem de dados e de energia, os veículos autônomos, os novos materiais, a
Internet das coisas etc.
Relatório do UBS (2016, p. 3), por sua
vez, defende que a Quarta Revolução Industrial está ancorada em duas forças. “A
primeira é a automatização extrema nos negócios, governo e vida privada. A
segunda, extrema conectividade, aniquila a distância e o tempo como obstáculos
à comunicação cada vez mais ampla e mais rápida (...)”.
Com efeito, a criação da plataforma Uber, por exemplo, somente foi possível
pelo aumento explosivo de aparelhos portáteis conectados à Internet.
Facebook, WhatsApp, Snapchat, Twitter e
Instagram passaram a desempenhar papel crucial na interação dos cidadãos em
todo o mundo.
Prado (2015) destaca os potenciais da inteligência
artificial: “um grupo de pesquisa descobriu uma nova proteína para o combate de
determinados tipos de câncer apoiados pelo sistema Watson [da IBM].
O supercomputador fez uma revisão de
mais de 100 mil estudos sobre o assunto e descobriu a nova proteína,
posteriormente confirmada pelos cientistas humanos.
Vejam, um software e
um supercomputador fizeram a descoberta. Esses sistemas hoje fazem traduções
simultâneas, respondem perguntas em celulares, substituem médicos, advogados,
contadores, policiais, economistas, operadores de mesa de bolsas, professores,
assistentes on-line.
Mas isso é apenas o
começo”.
O advento dos cobots, ou
robôs colaborativos, capazes de se “movimentar” e de interagir sem a
necessidade de posições fixas, tem potencial para trabalhar muito mais nas
cadeias produtivas do que os trabalhadores humanos menos qualificados.
Dessa forma, um dos impactos mais
importantes da Quarta Revolução Industrial deverá ser no mercado de trabalho.
Relatório preparado pelo Fórum Econômico Mundial projeta uma perda líquida de 5
milhões de empregos até 2020, sendo a perda de 7,1 milhões de empregos
compensada pela criação de 2,1 milhões de empregos em áreas mais
especializadas, tais como computação, matemática, arquitetura, engenharia,
mídia e entretenimento (Moreira e Ritt, 2016 e Cann, 2016).
Por conseguinte, a Quarta Revolução
Industrial deve favorecer os países mais desenvolvidos, em face do maior acesso
à tecnologia, à capacidade de inovação, à mão de obra qualificada, à cultura de
integração, à infraestrutura e ao capital necessário para gigantescos
investimentos, em detrimento daqueles mais intensos em mão de obra barata, que
tenderá a ser substituída por sistemas computacionais e robôs.
Além disso, a passagem do comércio
físico para o “virtual” pode ter impacto nos motores de crescimento das
economias emergentes.
Isso significa que as cadeias
produtivas tenderão a se encurtar, desencadeando outro período de
verticalização da produção de alta tecnologia e de distribuição das tecnologias
mais simples.
Já se observa, por exemplo, um retorno
de fábricas (onshoring) para os Estados Unidos.
Projeta-se ainda que este novo cenário
econômico pode fortalecer o dólar, como moeda de pagamentos e de reserva
internacional, em razão das vantagens competitivas detidas pelos Estados Unidos
com as tecnologias – e a propriedade intelectual – da Quarta Revolução
Industrial.
Enfim, baixo dinamismo no curto prazo e
mudança estrutural no médio e longo prazo constituem desafios gigantescos
colocados aos países em desenvolvimento.
Alguns poderão avançar; outros se
distanciarão ainda mais dos países desenvolvidos; uns provavelmente sucumbirão.
A secretária executiva da Cepal, Alícia Barcena, argumenta que “vivemos não uma
época de mudanças, mas uma mudança de época” (Prado, 2015).
Isso significa transformações das
estruturas, dos paradigmas técnico-científicos, da dinâmica econômica global.
Enfim, mudanças que ocorrem dentro das
estruturas e que transformam a própria estrutura.
* Marcos Antonio Macedo Cintra é técnico de Planejamento e Pesquisa da
Diretoria de Estudos e Relações Econômicas e Políticas Internacionais (Dinte)
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Integrante do Grupo de
Reflexão sobre Relações Internacionais/GR-RI.