Publicado em 03/12/2013
Alstom:
Promotoria da Suíça
encontra conta “Neves”, e agora?
Investigações sobre o esquema de
corrupção
montado pela multinacional Alstom
entram
em sua fase final prometendo grandes
surpresas
Começa a
fazer sentido o que para a classe política foi surpresa: a irritação e o tom
utilizado pelo Senador Aécio Neves (PSDB-MG) ao esbravejar contra o Ministro da
Justiça por ele ter enviado para Polícia Federal, a denúncia que recebera sobre
as investigações da promotoria da Suíça, em relação ao esquema de corrupção
montado pela multinacional Alstom com os tucanos.
Como já
noticiado pelo Novo Jornal,
as investigações ocorridas na Suíça não se restringiam apenas a área de
transporte, estendendo-se também à área de energia, como agora está
comprovado.
Documentos auditados na Suíça pela empresa KPMG Fides Peat mostram que
ultrapassa US$ 31 milhões o montante destinado pela Alstom à contas
offshore, localizadas em paraísos fiscais e que foram usadas para pagar suborno
aos políticos em quatro países, dos quais a maior parte foi destinada ao
governo de São Paulo, na gestão do Geraldo Alckmin, para obtenção de contratos
com estatais. A multinacional também enviou parte desses dólares para
Cingapura, Indonésia e Venezuela.
Um memorando da Cegelec - empresa comprada pela Alstom - datado de 21 de
outubro de 1997, menciona um certo "Claudio Mendes" como sendo
"um intermediário do G. (governo) de São Paulo", relacionando-o a um
pagamento de R$ 8,25 milhões em propina para a obtenção de um contrato no valor
de R$ 110 milhões com a Eletropaulo. O Ministério Público ouviu o sociólogo
Claudio Luiz Petrechen Mendes, atuante na área de energia, como o possível
suspeito de ser o "Claudio Mendes", intermediário que aparece nas
investigações.
Terceiro
nome revelado
Um terceiro personagem teria intermediado as negociações entre a Alstom
e o governo do PSDB de São Paulo no final da década de 1990. Identificado
apenas como "Neves", seu nome consta em comunicado apreendido pela
promotoria da Suíça, escrito em 23 de setembro de 1997. O manuscrito trata da
extensão dos 12 meses de contrato com a Empresa Paulista de Transmissão de
Energia Elétrica (EPTE) - e refere-se ao aditivo 10 presente no contrato Gisel
- para fornecimento de equipamentos às subestações Aclimação e Miguel Reale, no
Cambuci.
Neste manuscrito, ao lado do nome Neves aparecem "8,5%", que
os investigadores acreditam ser o percentual que essa pessoa teria recebido
para fazer a intermediação. Ao lado do número também consta a palavra
"fait" ( traduzido para o português: feito). Logo abaixo está o nome
Splendor, com 1% e a rubrica "fait"e na sequência, a sigla C.M. com
7%, sem a rubrica de "fait". No primeiro comunicado entre os diretores
da Cegelec discute-se o percentual que C.M. teria que receber. A sigla é
revelada mais adiante como Cláudio Mendes, que deveria receber 7% de
"remuneração". No corpo do texto é explicada a função do mesmo como
um intermediário com o governo de São Paulo.
A soma dos percentuais pagos a “Neves", Splendor e Cláudio Mendes
chega a 16,5% do valor total do aditivo em questão, algo em torno de R$ 100
milhões. E, em um segundo bilhete, datado de 21 de outubro de 1997, entre André
Botto e Bernard Metz, outro executivo da Cegelec, discute-se a remuneração que
seria destinada às finanças do PSDB, partido no poder na época ao Tribunal
de Contas do Estado de São Paulo e à Secretaria de Estado de Energia do Estado
de São Paulo.
Os investigadores acreditam ter identificado três dos códigos: "RM"
seria Robson Marinho, ex-secretário da Casa Civil do governo Covas e atual
conselheiro do TCE. "CM" seria o sociólogo e empresário Claudio Luiz
Petrechen Mendes, que atuou como lobista desde 1980 até 2004, e
"Splendor" é uma das seis offshores (empresas de fachada instaladas
em paraísos fiscais no exterior) usadas para os pagamentos de propina pela
Alstom.
A corrupção estaria relacionada a um contrato de R$ 101 milhões da
Eletropaulo, a antiga estatal de energia, privatizada em 1998. Os
investigadores acreditam que "Neves" era uma pessoa que transformava
o suborno da Alstom em "caixa de campanha do PSDB em outro Estado".
Os investigadores acreditam que elucidarão o código "Neves" quando
destrincharem o envolvimento do vereador paulistano Tião Farias (PSDB) com o
episódio. Farias foi um dos assessores mais próximos de Mário Covas, e foi
secretário-adjunto de Robson Marinho na Casa Civil.
Um ex-funcionário do setor de finanças da Alstom no Brasil disse ao
jornal “O Estado de S. Paulo” que a "remuneração" (suborno) a
"consultores" e "intermediários" nos contratos com o
Governo do Estado de São Paulo podia chegar a 30% do valor total de uma obra.
Essa pessoa - que não quis se identificar publicamente - disse que o suborno
era repassado pelas empresas subcontratadas.
Atualizada
às 11h48m do dia 03/12/2013:
Em represália a Polícia Federal quanto a denúncia do esquema de
corrupção pelo Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o secretário de
Energia de São Paulo, José Aníbal, se licenciará do cargo por dois dias para
reassumir o mandato como deputado federal e ser a principal voz do PSDB contra
o Ministro.
José Eduardo Cardoso estará nesta
quarta-feira (4) na Câmara, em audiência conjunta das Comissões de Segurança
Pública, Fiscalização e Controle, para falar sobre as investigações sobre o cartel dos trens em São Paulo.
“Eu quero olhar nos olhos desse ministro e perguntar por que ele se transformou
em um menino de recados de um deputado estadual do PT”, disse Aníbal. Ele
assumirá o mandato no lugar do deputado Carlos Roberto (PSDB-SP).
A manobra mostra a preocupação e a artilharia pesada que o PSDB prepara
contra o ministro da Justiça. Estratégias dessa natureza são utilizadas com
frequência em casos de votação de projetos importantes em plenário ou em
comissões. Mas a exoneração momentânea de um secretário de estado para
participar exclusivamente de uma audiência pública no Congresso não é um fato
corriqueiro.
O embate entre os dois promete ser duro. Tanto que, os tucanos tendem a
deixar a audiência marcada para esta terça-feira (3) na Comissão de
Constituição e Justiça do Senado, em temperatura morna, beirando o tédio. “Não
vai ter gritos, baixarias, xingamentos. Isso tudo vai ficar reservado para a
Câmara”, disse um interlocutor da bancada tucana na Casa.
Atualizada às 12h02m do dia 03/12/2013:
A força-tarefa do Ministério Público Estadual, Procuradoria da República
e Polícia Federal que investiga o caso Alstom pediu cooperação da Inglaterra
para repasse de informações e documentos relacionados a eventuais pagamentos de
propinas no Brasil pela multinacional francesa. O pedido foi enviado a Londres
em novembro, com base na Convenção da ONU contra a Corrupção - acordo de
assistência legal mútua entre Estados Partes para combate a esse tipo de crime.
A Alstom é o alvo principal de investigações abertas pelo Ministério
Público e pela PF em 2008. Dirigentes da companhia teriam corrompido agentes
públicos da área de energia nos governos do PSDB. A Alstom é citada também como
integrante de cartel metroferroviário que teria obtido licitações milionárias
no setor de transportes das gestões tucanas entre 1998 e 2008.
O inquérito da PF atribui crimes a 11 investigados, entre eles políticos
do PSDB. O inquérito já foi concluído e as provas decorrentes deste, foram
anexadas aos autos do caso Siemens - multinacional alemã que fez acordo de
leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), por meio do
qual revelou a ação do cartel metroferroviário.
Os promotores brasileiros foram informados pelo Ministério Público da
Suíça sobre a investigação de promotores ingleses que também miram a Alstom. Em
2010, três diretores da Alstom foram presos na Inglaterra.
A cooperação da Inglaterra foi feita em pedido único, assinado por
promotores de Justiça do Patrimônio Público (Ministério Público Estadual), uma
promotora do Grupo de Atuação Especial e Combate ao Crime Organizado (Gaeco),
uma procuradora da República e um delegado da PF.
Esse é o segundo pedido internacional de cooperação no caso
Alstom/Siemens. O outro foi enviado a Alemanha, relativo ao caso Siemens - o
Ministério Público de São Paulo recorreu à promotoria de Munique por meio de
pedido às autoridades judiciais da Baviera, onde a fica a matriz da empresa,
para que autorizem a liberação de informações sobre o cartel metroferroviário
no Brasil.
Por meio do pedido de cooperação à Inglaterra, a força-tarefa do
Ministério Público e da PF pede dados exclusivamente relativos à Alstom.
A Justiça britânica suspeita que dois funcionários da multinacional
francesa seriam responsáveis por organizar o pagamento de propinas para agentes
públicos no Brasil. Teriam sido pagos mais de US$ 120 milhões em propinas para
garantir contratos públicos em todo o mundo. Parte do valor teria vindo para o
Brasil. As suspeitas são de que a rota das propinas passava por Paris, Londres
e chegava a servidores públicos brasileiros.
Conclusões do Escritório contra Fraude no Reino Unido revelam que os
pagamentos estariam disfarçados de consultorias. De acordo com o documento,
essa era uma "estratégia global" da empresa.