06 de janeiro de 2014
Jornalismo
é contraponto
Carlos Alberto Di Franco* - O Estado de S.Paulo
Entramos em ano eleitoral.
Campanhas milionárias, promessas surrealistas e imagens produzidas fazem parte
do marketing dos políticos.
Assiste-se, frequentemente, a um show de efeitos especiais capazes de seduzir o grande público, mas, no fundo, vazio de conteúdo e carente de seriedade.
Assiste-se, frequentemente, a um show de efeitos especiais capazes de seduzir o grande público, mas, no fundo, vazio de conteúdo e carente de seriedade.
O marketing, ferramenta
importante para a transmissão da verdade, pode ser transformado em instrumento
de mistificação. Os programas eleitorais, mais uma vez, venderão uma bela
embalagem, mas, de fato, tentarão fugir da discussão das ideias. Nós,
jornalistas, somos (ou deveríamos ser) o reverso a essa tendência.
Jornalismo é contraponto.
Cabe-nos a missão de rasgar a embalagem e desnudar os candidatos. Só nós, estou
certo, podemos minorar os efeitos perniciosos de um espetáculo audiovisual que,
certamente, não contribui para o fortalecimento de uma democracia verdadeira e
amadurecida.
Por isso uma cobertura eleitoral
de qualidade é, antes de mais nada, uma questão de foco. É preciso declarar
guerra ao jornalismo declaratório e assumir, efetivamente, a agenda do cidadão.
Não basta um painel dos candidatos, é preciso cobrir a fundo as políticas
públicas que mexem com a vida das pessoas. É importante fixar a atenção não nos
marqueteiros e em suas estratégias de imagem, mas na consistência dos programas
de governo.
O nosso papel é ouvir as
pessoas, conhecer suas queixas, identificar suas carências e cobrar soluções
dos candidatos. Não se pode permitir que as assessorias de comunicação dos
políticos definam o que deve ou não ser coberto. O centro do debate tem de ser
o cidadão, as políticas públicas, não mais o político, tampouco a própria
imprensa. Na prática, não obstante a teoria da agenda-setting (Maxwell McCombs
e Donald Shaw, formuladores da hipótese, afirmam que o debate público é
determinado pelas pautas dos jornalistas) atribuir à imprensa uma influência
decisiva na determinação da agenda do público, tal poder, de fato, passou a ser
exercido pelos políticos. O jornalismo de aspas, pobre e simplificador,
repercute o Brasil oficial, mas oculta a verdadeira dimensão do País real.
Precisamos fugir do espetáculo e fazer a opção pela informação. Só assim, com
equilíbrio e didatismo, conseguiremos separar a notícia do lixo declaratório.
Outros desvios éticos podem
comprometer a qualidade da cobertura eleitoral. Sobressai, entre eles, o
perigoso jornalismo de dossiê. Os riscos de instrumentalização da imprensa são
evidentes. Os protagonistas do teatro político não medirão esforços para fazer
a mídia, à sua revelia, destilar veneno nos seus adversários. Por isso é
preciso revalorizar, e muito, as clássicas perguntas que devem ser feitas a
qualquer repórter que cumpre uma pauta investigativa: checou? Tem provas? A
quem interessa essa informação? Trata-se de eficiente terapia no combate ao
vírus da leviandade.
O esforço de isenção, no
entanto, não se confunde com a omissão. O leitor espera uma imprensa combativa,
disposta a exercer seu intransferível dever de denúncia. A sociedade quer um
quadro claro, talvez um bom infográfico, que lhe permita formar um perfil dos
candidatos: seus antecedentes, sua evolução patrimonial, seu desempenho em
cargos atuais e anteriores, etc. Impõe-se também um bom levantamento das
promessas de campanha. É preciso mostrar os eventuais descompassos entre o
discurso e a realidade. Trata-se, no fundo, de levar adiante um bom jornalismo
de serviço.
Os políticos, pródigos em
soluções de palanque, não costumam perder o sono com o rotineiro descumprimento
da palavra empenhada. Afinal, para muitos deles, infelizmente, a política é a
arte do engodo. Além disso, contam com a amnésia coletiva. O jornalismo de
qualidade deve assumir o papel de memória da cidadania. Precisamos falar do
futuro, dos projetos e dos planos de governo. Mas precisamos também falar do
passado, das incoerências e das ambiguidades.
Armação da imprensa.
Distorção da mídia.
Patrulhamento de jornalista.
Quantas vezes, caro leitor, você registrou essas reações nas páginas dos jornais? Inúmeras, estou certo.
Recentemente, um condenado do mensalão se referiu à imprensa que desencadeia a pressão popular contra homens públicos aéticos e governantes corruptos comparando-a, com cinismo, à "ditadura militar".
Tais declarações, característica de políticos apanhados com a boca na botija, não devem preocupar. Afinal, todos, independentemente do seu colorido ideológico, procuram o bode expiatório para justificar seus crimes, deslizes e malfeitos. A culpa é da imprensa! O grito é uma manifestação de desprezo pela verdade.
Distorção da mídia.
Patrulhamento de jornalista.
Quantas vezes, caro leitor, você registrou essas reações nas páginas dos jornais? Inúmeras, estou certo.
Recentemente, um condenado do mensalão se referiu à imprensa que desencadeia a pressão popular contra homens públicos aéticos e governantes corruptos comparando-a, com cinismo, à "ditadura militar".
Tais declarações, característica de políticos apanhados com a boca na botija, não devem preocupar. Afinal, todos, independentemente do seu colorido ideológico, procuram o bode expiatório para justificar seus crimes, deslizes e malfeitos. A culpa é da imprensa! O grito é uma manifestação de desprezo pela verdade.
Personalidades públicas,
inúmeras, têm procurado usar a mídia. Afirmam e depois, cinicamente, desmentem
o que afirmaram. Nós não podemos ficar reféns desse jogo. Os meios de
comunicação existem para incomodar. Um jornalismo cor-de-rosa é socialmente
irrelevante. A imprensa, sem precipitação e injustos prejulgamentos, tem o
dever de desempenhar importante papel na recuperação da ética na vida pública.
Nosso compromisso não é com as celebridades, mas com a verdade, com a
informação bem apurada, com os leitores. E nada mais.
O Brasil está passando por uma
profunda mudança cultural. A corrupção, infelizmente, sempre existirá. Mas uma
coisa é a miséria do homem e outra, totalmente diferente, é a indústria da
corrupção que está aí. Esta, sem dúvida, deve e pode ser combatida com os
instrumentos de uma sociedade civilizada. Transparência nos negócios públicos,
ética e competência são as principais demandas da sociedade. Memória e voto
consciente compõem a melhor receita para satisfazê-las.
*Carlos Alberto Di Franco é doutor em comunicação pela Universidade de Navarra
e diretor do departamento de comunicação do Instituto Internacional de
Ciências Sociais.
E-mail: difranco@iics.org.br.
E-mail: difranco@iics.org.br.