29 DE MAIO DE 2014
OS NEOPREOCUPADOS
COM OS
POBRES
A defesa da
inclusão social e produtiva é sempre bem-vinda. Os palpites, porém, devem ter
limites, quando se trata da vida de 14 milhões de famílias. Há de se ter
responsabilidade quando o tema é o Bolsa Família
TEREZA CAMPELLO*
Os debates sobre o
Bolsa Família costumam despertar paixões. Quase todo mundo tem uma opinião a
respeito, ainda que não conheça direito como funciona o programa. Prosperam os
palpites.
Ao longo de seus mais de dez anos de história, o Bolsa Família
tem sido vítima de uma coleção de preconceitos contra os pobres. Ora dizem que
as famílias terão mais filhos para ganhar um benefício maior. Ora criticam as
famílias pobres por não saberem gastar. Há quem acuse os beneficiários de
preguiçosos.
Esses mitos contrariam estatísticas oficiais e estudos
científicos. A taxa de fecundidade dos mais pobres caiu mais do que a média
nacional. As mães gastam o dinheiro do benefício com alimentos, o que
proporcionou queda de 58% da mortalidade infantil causada pela desnutrição.
A maioria dos beneficiários adultos trabalha muito. Se continuam
pobres, isso é decorrência da inserção precária no mercado de trabalho. Em
busca de melhores oportunidades, beneficiários preencheram, antes do prazo
previsto, 1 milhão de vagas em cursos de qualificação profissional do Pronatec,
por exemplo. Em outra frente da inclusão produtiva, já se formalizaram 400 mil
microempreendedores.
Se o preconceito e a desinformação ainda alimentam mitos, talvez
só a ansiedade do momento eleitoral possa explicar o comportamento dos que se
apresentam agora como neodefensores dos pobres. Em época de eleição, são raros
os políticos que falam mal do Bolsa Família. Mas muitos tentam pegar carona nos
êxitos do programa falando absurdos.
Na seção "Tendências/Debates" da Folha, o líder do
PSDB na Câmara dos Deputados, Antonio Imbassahy ("Leviandade?",
20/5), defendeu que os benefícios do Bolsa Família fossem corrigidos pela
cotação do dólar, sujeitando a política pública às flutuações de mercado da moeda
norte-americana.
O deputado e seu partido não entenderam que a linha de extrema
pobreza do país foi definida em R$ 70, em junho de 2011, com base no parâmetro
internacional usado pelas Nações Unidas: o poder de compra de US$ 1,25 diário
por pessoa nos diferentes países. É a chamada paridade de poder de compra,
diferente da simples conversão ao câmbio do dia.
A presidenta Dilma Rousseff usou o mesmo critério ao atualizar a
linha de extrema pobreza e os benefícios do Bolsa Família, em anúncio feito na
véspera do 1º de Maio.
Nos últimos três anos, inovações no Bolsa Família garantiram
reajuste de 44% acima da inflação para o benefício médio do programa. Ele
passará a R$ 167 mensais por família, em junho. Mais importante: foi garantido
que nenhuma família vivesse com menos de R$ 70 mensais por pessoa, consideradas
a renda familiar e a complementação do benefício. Esse valor passa, também em
junho, para R$ 77.
Ao longo de três anos, seis mudanças foram implementadas e a
oposição não se manifestou. Por que só se manifestam agora os neopreocupados
com os pobres?
No terceiro ano do plano Brasil Sem Miséria, o país é a maior
referência mundial em políticas de combate à pobreza e à desigualdade. Com os
resultados obtidos até aqui, estamos a um passo de superar a extrema pobreza.
Mas o fim da miséria é só um começo. Além de renda e emprego, trabalhamos por
melhor qualidade de vida para todos.
A defesa da inclusão social e produtiva é sempre bem-vinda. Os
palpites, porém, devem ter limites, quando se trata da vida de 14 milhões de
famílias. Há de se ter responsabilidade quando o tema é o Bolsa Família.
* TEREZA CAMPELLO, 50, economista, é ministra do Desenvolvimento
Social e Combate à Fome