10/09/2014
IMPRENSA & PODER
A reboque
dos marqueteiros
Por Luciano Martins Costa
A
imprensa brasileira é frágil: seu ponto mais vulnerável é o fascínio que muitos
jornalistas sentem pelo poder, aquela sensação de potência produzida pela
proximidade com o brilho dos salões oficiais.
Essa
fragilidade se agrava nas temporadas de reprodução dos votos, quando os
detentores do poder político precisam se expor ao escrutínio público – e usam a imprensa para conduzir suas
mensagens.
Em dias como o de hoje, percebe-se
claramente como os estrategistas de campanha definem a pauta dos jornais. Essa é
uma circunstância que pode ser observada em todos os períodos em que se renovam
os principais poderes da República, mas neste ano, em especial, pode-se afirmar
que as redações das empresas de comunicação dominantes foram transformadas em
subsidiárias de comitês de campanha.
Há
uma razão muito simples: dificilmente haverá outra oportunidade, no futuro
próximo, para desalojar do poder as forças políticas que ocupam Brasília.
A
outra razão, mais difícil de demonstrar: em caso de reeleição da atual
presidente, haverá um processo de mudança radical no quadro partidário, com a
extinção de algumas legendas da atual oposição.
O
Partido Democratas, que não possui nenhum representante em posição de
relevância no atual embate eleitoral, já foi minado pelo surgimento de três
legendas recém-criadas: o PSD, o PROS e o Solidariedade.
Sem condições de oferecer uma mensagem de renovação, e manietado
por uma ideologia contrária ao abraço das multidões, o DEM esvazia-se
rapidamente conforme surgem para seus integrantes outras opções de aproximação
com o poder.
Entre analistas da política, cresce a convicção de que o outro
partido sob risco de extinção é o Partido da Social Democracia Brasileira, PSDB
Essa
avaliação foi feita explicitamente em público, pela primeira vez, pelo coordenador
da campanha presidencial do Partido Socialista Brasileiro, o deputado federal
licenciado Walter Feldman, que se elegeu pelo PSDB em 2010.
Em reunião com líderes do comércio de luxo em São Paulo, ele
afirmou que a sigla que tem como símbolo o tucano poderá desaparecer se perder
a eleição presidencial deste ano.
A
última cereja
Pode-se colocar a
afirmação de Feldman na conta das espertezas que compõem todas as disputas pelo
voto. No entanto, há muita verossimilhança em suas palavras.
Embora, segundo a reportagem
da Folha de S. Paulo, que acompanhou sua reunião com parte da elite
paulistana, ele não tenha conseguido convencer seus interlocutores a apoiar
Marina Silva, o recado foi dado: se a presidente Dilma Rousseff for reeleita,
ou Marina Silva chegar ao Planalto, aquela fração da sociedade brasileira que
se considera a última autêntica cereja ao maraschino na taça de martini ficará
sem um partido para chamar de seu.
Agora,
voltando ao tema proposto para esta conversa: onde é que se mostra, aqui, a
citada ruptura entre imprensa e jornalismo?
Simples:
neste período, engajada na tarefa de colocar no poder aqueles que considera
mais palatáveis, a mídia tradicional trata como informação pura e simples o que
é mera manobra de marqueteiros de campanha.
Certamente,
a idéia de tentar cooptar representantes da elite econômica de São Paulo não
surgiu de um devaneio do deputado Feldman: ele se moveu baseado em análises
elaboradas pelos estrategistas do PSB.
A
imprensa tem noticiado que a candidata Marina Silva pode ter tocado o teto do
seu potencial eleitoral: o rastreamento das intenções de voto mostra a
ex-ministra em curva descendente, com o candidato do PSDB encalhado nos 15% e a
presidente Dilma Rousseff recuperando terreno, principalmente em São Paulo e no
Rio.
A
nova safra de escândalos não parece ter influenciado significativamente o
eleitorado e, a três semanas do primeiro turno, a ex-ministra do Meio Ambiente
precisa consolidar sua posição no campo conservador, onde os votos são menos
voláteis. Portanto, faz sentido tentar convencer a parte de cima do edifício
social de que o PSB é o novo PSDB.
Têm o
mesmo objetivo os afagos de Marina Silva ao ex-presidente Fernando Henrique
Cardoso – que, mesmo avançado nos anos, ainda não se desapegou do prazer do
cafuné no ego.
Mas o mais interessante é observar como a
imprensa participa do jogo, ao apresentar manobras de marqueteiros e bate-bocas
cuidadosamente planejados como fatos políticos relevantes.