O ministro da fazenda Joaquim Levy e o
secretário-geral
da OCDE, Angel
Gurría, divulgam relatórios sobre o Brasil
A Organização Para a
Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) é um clube de países ricos
atualmente empenhado em disseminar pelo mundo propostas de combate à sonegação
de impostos. Em viagem ao Brasil nos últimos dias, seu secretário-geral, Angel
Gurría, tratou do assunto com Dilma Rousseff e com o ministro da Fazenda,
Joaquim Levy.
Deve ter voltado para
a casa decepcionado.
Enquanto Levy e Gurría
reuniam-se na terça-feira 3, a Câmara derrubou uma proposta anti-sonegação
apresentada pelo Ministério da Fazenda por inspiração da OCDE.
A proposta obrigava os
contribuintes a informar uma vez por ano à Receita Federal todas as operações
feitas para pagar menos imposto, o chamado planejamento tributário. Nada feito:
239 deputados votaram contra e só 169, a favor.
Na justificativa
enviada ao Congresso junto com a proposta, Levy dizia que a “medida estimula
uma postura mais cautelosa por parte dos jurisdicionados [contribuintes] antes
de fazer uso de planejamentos tributários agressivos”.
O governo anda
surpreso com o tamanho da criatividade empregada pelos contribuintes para fugir
do Leão. Na Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, há quem identifique
operações a resvalar a ilegalidade.
Para enfrentar isso, a
ideia era que o Fisco pudesse analisar as operações de planejamento tributário
e, caso as considerasse acintosamente sonegadoras, tivesse o direito de cobrar
o imposto devido.
E mais: de multar o
contribuinte em 150% do valor do imposto caso a declaração não fosse entregue
ou aceita.
Dilma Rousseff recebe Gurría,
da Organização para a Cooperação
e Desenvolvimento Econômico
Na justificativa, Levy citava a OCDE como fonte de
inspiração para a ideia do informe obrigatório, modelo já experimentado nos
Estados Unidos, Inglaterra, Portugal, Canadá, Irlanda e África do Sul.
A declaração obrigatória é um
dos itens de um pacote que a OCDE tenta emplacar pelo mundo no combate à
sonegação, o Plano de Ação sobre Erosão da Base Tributária e Transferência de
Lucros. Lançado em 2013, o Beps, na sigla em inglês, recomenda aos governos
“exigir dos contribuintes que divulguem os seus arranjos de planejamento fiscal
agressivos”.
Em um documento após um encontro
em Paris este ano, a OCDE diz que os principais objetivos do informe
obrigatório são desvendar esquemas de evasão fiscal, identificar seus autores e
reduzir a prática. “A maioria dos regimes de divulgação obrigatória existentes
são bem-sucedidos em termos de cumprimento desses objetivos”, afirma.
No Brasil, a proposta foi
bombardeada desde sua apresentação por Joaquim Ley. Os porta-vozes da
resistência foram sobretudo advogados tributaristas, presumivelmente donos de
clientes praticantes de planejamento tributário.
Uma amostra da crítica foi vista
no dia que os deputados derrubaram a proposta. Em uma audiência pública na
Câmara, Marcelo Knopfelmacher, presidente do Movimento de Defesa da Advocacia,
disse que o Brasil não devia “importar conceitos”, pois aqui “ninguém aguenta
mais pagar imposto”. Uma visão, disse ele, extensiva a medidas de cerco ao
planejamento tributário.
Diante da enxurrada de críticas,
houve uma tentativa do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) de salvar a proposta,
amenizando-a.
O tucano era o relator em uma
comissão especial de deputados e senadores que examinou a medida provisória
685, dentro da qual estava a regra de declaração obrigatória. Em seu parecer,
ele acabou com a multa de 150%. E dizia que deveriam ser entregues à Receita
informes de operações descritas previamente em uma lista do Leão. Era preciso,
escreveu Jereissati, “criar regramento adequado e seguro para o tratamento da elisão
fiscal abusiva, ou seja, do planejamento tributário ilícito”.
Não adiantou. O abrandamento foi
insuficiente até para convencer os deputados do partido de Jereissati. Dos 47
tucanos presentes à votação na Câmara, só um, o baiano Jutahy Junior, votou a favor
do informe obrigatório. A oposição (PSDB, DEM, PPS, PSB, Solidariedade) em peso
ficou contra.
Entre os governistas, um
festival de traições. No PMDB, maior aliado do governo, 30 votaram contra a
proposta e 24 a favor. No PT de Dilma Rousseff, três dos 56 votantes disseram
“não”. No PSD, controlador do Ministério das Cidades, dos 27 votantes, só três
disseram “sim”. No PP, à frente do Ministério da Integração Nacional, foram 15
votos contra e 13 a favor.
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